Decisão pode ocasionar corrida por aposentadoria para 7 mil servidores No RN

Pedro Lopes alerta para efeitos do prazo estipulado pelo TCE nos serviços públicos do Estado – Foto: Adriano Abreu

 

O Governo do Estado protocolou, nesta quarta-feira (24) um recurso contra o Acórdão 733/2023, do Tribunal de Contas do Estado. O acórdão dispõe que servidores que ingressaram no Estado sem concurso público antes da promulgação da Constituição de 1988, e que já possuem os requisitos para aposentadoria, podem se aposentar até 25 de abril deste ano para se manter nas regras próprias de regime previdenciário. Do contrário, eles precisariam migrar para o INSS, seguindo determinação do Supremo Tribunal Federal. Isso poderá levar a uma corrida por aposentadorias para 7.126 servidores públicos estaduais e municipais, que já contam com mais de 35 anos de serviço público.

Segundo levantamento realizado pela Diretoria de Atos de Pessoal do TCE/RN, existem 42 regimes próprios de previdência social no Estado do Rio Grande do Norte e pelo menos 32 admitem, com base em previsão legal específica, a filiação de servidores sem concurso público. Nesses 32 regimes estão 7.126 servidores públicos ativos que ingressaram no serviço antes da Constituição de 88 sem concurso público e já completaram o tempo de se aposentar ou estão em vias de atender os requisitos. Outros 5.551 servidores inativos nesse grupo foram admitidos antes da Constituição sem concurso público, mas já recebem o benefício da aposentadoria.

Publicado em dezembro de 2023, em resposta à consulta formulada por instituições de previdência própria de municípios do RN, o Acórdão orienta que o servidor que entrou no serviço público sem concurso pode continuar vinculado à previdência do Estado ou de algum município, se já estiver aposentado ou se aposentar até 25 de abril de 2024. Do contrário, o trabalhador deve se vincular ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), administrado pelo INSS, por determinação do STF.

A Procuradoria Geral do Estado requer o efeito suspensivo da decisão e argumenta, face ao Acórdão nº 733/2023 – TC (evento 47), “a existência de obscuridades, contradições e omissões que impossibilitam o correto cumprimento das determinações exaradas na decisão”.

Por meio de nota, a Corte de Contas esclareceu que “a resposta emitida adota entendimento pacificado no STF que reafirmou, no dia 12 de julho de 2023, a tese de que servidores admitidos sem concurso público até a promulgação da Constituição Federal de 1988 devem se vincular ao RGPS e não sob as regras dos Regimes Próprios de Previdência Social”. O TCE informou que “modulou os efeitos da decisão, fixando como prazo a data de 25 de abril de 2024, de forma a preservar as situações funcionais dos servidores que já possuem direito à aposentadoria, com o consequente registro no RPPS, sem necessidade de vinculação ao Regime Geral”.

De acordo com o Tribunal, a modulação utiliza uma data limite já adotada pelo STF em caso semelhante. “Desta forma, é inverídico afirmar que o TCE estaria ‘forçando’ servidores a pedir aposentadoria. O TCE reafirma seu compromisso com a legislação vigente no país, notadamente a Constituição Federal, e o cumprimento das decisões da Suprema Corte. Ao mesmo tempo, reconhece a importância de preservar direitos individuais e coletivos, buscando assim uma solução que atenda à decisão do STF e, ao mesmo tempo, minimize eventuais prejuízos causados aos servidores públicos”.

O TCE não comentou sobre a decisão do Governo do Estado de pedir a revisão da decisão. Se não obtiver êxito no recurso apresentado à Corte de Contas, o Governo poderá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque o Governo discorda da compreensão do TCE sobre a jurisprudência da Corte Suprema, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 573 e no Tema de Repercussão Geral nº 1254.

 

Pedro Lopes alerta para efeitos do prazo estipulado pelo TCE nos serviços públicos do Estado – Foto: Divulgação

 

Estado
A decisão, de acordo com a Secretaria de Administração do RN (Sead), poderá implicar na concessão de 3.690 aposentadorias até essa data, afetando 18 órgãos, somente no funcionalismo estadual. “Na Jucern, são 20 servidores efetivos e desses, 19 estão na condição de se aposentar até abril de 2024. No setor de RH da Sead, temos praticamente todos os servidores nesta situação. O Instituto de Previdência do Estado tem 70 servidores, dos quais 63 já podem se aposentar até abril. Então, haverá muita dificuldade nos órgãos se essa orientação prosperar”, afirma Pedro Lopes.

Ele disse que, como o Estado está há anos acima do limite prudencial, não há condições de repor o quadro se as aposentadorias forem concretizadas. Além disso, com a perda de receita em decorrência da redução da alíquota do ICMS – que caiu de 20% em 2023 para 18% neste ano – , a realização de um concurso público para reposição é inviável. “Isso [concurso] até poderia acontecer, mesmo com o Estado acima do limite prudencial, se o TCE fizesse uma autorização especial para tal, por meio de um termo de ajuste de gestão”, comenta o secretário.

Segundo diz, com a redução da alíquota modal do ICMS, a partir de fevereiro, haverá redução uma redução em torno de R$ 70 milhões nas receitas estaduais. “E se tivéssemos a autorização especial do TCE, teríamos uma despesa extraordinária de R$ 13 milhões por mês. Não dá para colocar essa conta no fluxo de caixa do Governo”, completa Pedro Lopes.

Em Natal, mais de 10% do funcionalismo poderá ser impactado

O Município de Natal também será afetado com a decisão do TCE/RN. Neste caso, 1.271 servidores teriam que se aposentar de forma imediata, de acordo com o Instituto de Previdência de Natal (NatalPrev), o que acarretaria na perda de mais de 10% da força de trabalho do quadro municipal (cujo total ultrapassa os 11 mil servidores ativos).

O presidente do NatalPrev, Thiago Marreiros, aponta consequências para o próprio Instituto de Previdência. “Primeiro, a gente não tem condições de atender a esse quantitativo de processo de aposentadoria em tão curto espaço de tempo. Depois, provocaria um aumento da despesa previdenciária e perda de arrecadação, uma vez que parte do universo de servidores deixará de contribuir”, destaca.

Os impactos das despesas em números para o Instituto ainda estão sendo calculados. Marreiros ressalta que os efeitos afetam também os próprios servidores com a perda de rendimentos. “De certa forma, o acórdão está impondo o dever de o segurado se aposentar, sob pena de ser desfiliado do RPPS e de se filiar ao RPGS. Naturalmente, os cálculos de aposentadoria, neste caso, serão impactados e o provento a ser estabelecido pelo RPGS com certeza será menor do que o estabelecido pelo regime próprio”, indica ele.

Pedro Lopes, titular da Sead/RN, reforça esse ponto porque diz que no Regime Próprio de Previdência, o servidor se aposenta com integralidade e mantém relação com os ativos, que são instrumento de paridade. “Na hora em que esse servidor vai para o INSS, perde a integralidade e deverá se aposentar pela média da contribuição, resultando em uma perda no valor da aposentadoria”, explica.

A recomendação, segundo o secretário, é de que os servidores aguardem o desfecho das discussões junto ao TCE. Já o presidente do NatalPrev informou que o Município não é parte no acórdão, mas diz ter procurado o TCE para abrir um diálogo sobre o tema. “Cabe judicialização, mas nesse primeiro momento a gente quer resolver dentro da ideia de diálogo, se colocando à disposição para prestar esclarecimentos em torno da questão”, frisou Thiago Marreiros.

Sinsp ajuíza ação
A decisão do TCE está mobilizando os sindicatos das respectivas categorias. Nesta quarta-feira (24), o Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público da Administração Direta do Estado do Rio Grande do Norte (Sinsp/RN) reuniu os trabalhadores em assembleia e incluiu o assunto na pauta. Na ocasião, decidiram ajuizar ação no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) para derrubar a decisão da Corte de Contas.

“O nosso sindicato não aceitará essa ação arbitrária do Tribunal de Contas do Estado, pois o Acórdão contém vício de legalidade. Entraremos com um pedido de liminar urgente. Esses servidores, se entrarem no Regime Geral, vão perder a integralidade, o direito de reajuste após chegar a inativa, e ainda vão sofrer com perda financeira, pois vão se aposentar com remuneração menor do que as que recebem atualmente”, explicou a sindicalista.

Além do Sinsp, em nota conjunta o Sindsaúde/RN, o Sinai-RN, o SindItep/RN, Sinpol, Sinte/RN, Soern, Sindern, Sintern, Sinsp/RN e as centrais CSP-Conlutas, CUT e Intersindical publicaram uma nota conjunta na qual pedem que o TCE revogue a decisão e exigindo que a governadora Fátima Bezerra judicialize contra a medida “para evitar um colapso na prestação dos serviços públicos”. Para fortalecer esse movimento de resistência, esses sindicatos convocaram um Ato público na terça-feira (30) às 9h, na frente do TCE/RN, com entrega de ofício das entidades solicitando uma audiência.

Entenda
O Supremo Tribunal Federal reafirmou, no dia 12 de junho de 2023, o entendimento de que servidores não concursados não podem se aposentar pelos regimes de previdência dos estados e municípios. A decisão vale para todo o País e deve ser seguida por todos os órgãos da Justiça

 

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