Há 10 anos, Natal era uma das cidades-sede da Copa do Mundo e isso trouxe promessas de mudanças na sua infraestrutura, com obras de mobilidade urbana, potencialização dos setores econômicos e novos equipamentos, como o Aeroporto na região Metropolitana e o surgimento do que seria o novo “palco das emoções” da capital, a Arena das Dunas. Após uma década, a capital potiguar pode contar com parte do legado prometido ao recber partidas do mundial, mas nem todo o potencial prometido pôde ser aproveitado.
A começar pelo Aeroporto Internacional Governador Aluízio Alves, que foi construído em São Gonçalo do Amarante, distante cerca de 18km de Natal. Incluído na Matriz de Responsabilidades da Copa do Mundo de 2014, o terminal aéreo substituiu o Aeroporto Internacional Augusto Severo, em Parnamirim, a 16km da capital, que após a última reforma em 2012 chegou a uma capacidade 5,8 milhões de passageiros por ano. A capacidade do novo aeroporto é de 6,5 milhões de passageiros por ano, mas atualmente, o fluxo não corresponde ao previsto, com uma diferença de mais de 4 milhões do que se esperava.
Tanto é que o Consórcio Inframérica, que arrematou a concessão do equipamento, anunciou o interesse de deixar o terminal em 2020, alegando ter investido R$700 milhões em infraestrutura e estar enfrentando dificuldades. Em 2019, existia a expectativa de um fluxo de passageiros de 4,3 milhões, mas o número registrado foi de 2,3 milhões.
A Zurich Airport assumiu o terminal neste ano de 2024, por R$320 milhões, no primeiro processo de relicitação do país. A companhia diz que já investiu R$ 8,4 milhões, entre melhorias, processos e aperfeiçoamento de atendimentos e afirma que existe uma equipe dedicada em buscar a ampliação de voos para aumentar o fluxo. “Todos os equipamentos de grande porte são construídos com perspectiva de longo prazo e temos certeza do crescimento no movimento”, destacou em nota.
A chegada do aeroporto foi bem recebida devido as grandes projeções da época. No entanto, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do RN (ABIH-RN), Abdon Gosson, acredita que a baixa movimentação para implantação de novos destinos pode justificar o que chama de “subutilização” do terminal. “O Governo e entidades precisam fazer o trabalho de promoção e divulgação para aguçar o prazer de visitar o nosso destino. Agora se tem um Aeroporto, mas não aparece nenhuma opção nova de voo. Não podemos ficar só entre Natal, São Paulo e Brasília”, analisa.
A construção de um novo Aeroporto, exigiu melhorias na infraestrutura do seu entorno para facilitar a conexão com as demais áreas da capital e possibilitar melhor infraestrutura aos visitantes. O Governo do Estado e a Prefeitura do Natal apresentaram, em conjunto, ao Ministério das Cidades um pacote de 18 obras prioritárias. Contudo, pelo menos quatro delas, até este mês de junho, ainda não foram entregues. É o caso da reestruturação da Avenida Roberto Freire, Corredor Zona Norte/Arena das Dunas, Avenida Jerônimo Câmara, requalificação da Avenida Felizardo Moura e a adaptação de novas calçadas. Essas duas últimas estão em andamento, com previsão de finalização em julho e agosto, respectivamente.
Impulso ao comércio e turismo interrompido
Entre os setores que seriam beneficiados pela alta demanda gerada pela Copa do Mundo em Natal, estava o Comércio e o Turismo. Naquele ano da Copa, um levantamento realizado pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Rio Grande do Norte (Fecomércio RN) apontou para um crescimento de 3,2% do varejo potiguar em 2024. Em comparação a Paraíba, estado vizinho que não recebeu jogos da copa, a diferença foi de 0.6 ponto percentual, equivalendo a R$ 16,8 milhões a menos por lá. Somente no período em que os quatro jogos ocorreram, a movimentação ultrapassou os R$ 330 milhões no RN.
Na hotelaria, outro segmento fortemente impactado, a rede teve uma ocupação média de 85%, superior ao que era registrado normalmente nos meses de junho, que costumava ficar em 65%. Quando a capital do estado foi anunciada como cidade-sede do mundial, o então presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do RN (ABIH-RN), Habib Chalita, chegou a dizer que a competição na capital seria um “tiro no pé”.
Hoje, ele reanalisa seu posicionamento. “Na época precisávamos ter 35 mil leitos cadastrados para podermos concorrer como sede. Colocamos mais de 40 mil, e ficamos preocupados se Natal teria condições. E Natal teve condições. Abrimos um grande mercado”, avalia Chalita, que hoje preside o Sindicato de Hotéis, Restaurantes Bares e Similares do Rio Grande do Norte (SHRBS-RN).
Em 2014, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) também sentiu esse impacto positivo, com destaque em áreas turísticas, como Ponta Negra e demais praias centrais, além do entorno da Arena das Dunas. “Em Ponta Negra, o maior faturamento anual acontece no mês de janeiro. Nos 15 dias da Copa, foi vendido o equivalente a um mês de janeiro inteiro”, relembra Max Fonseca, que era presidente da entidade na época.
Contudo, o bom resultado nesses setores naquele período não resistiu à crise econômica que chegaria um ano depois em todo o Brasil. Em termos de Produto Interno Bruto (PIB), a retração da economia brasileira em 2015 (estimada pelo mercado em 3,62%) se consolidou como o pior resultado em 25 anos.
Marcelo Queiroz, presidente da Fecomércio RN na época e ainda no cargo, diz que, diante da cries, a Copa ajudou o estado a ter uma retração menor do que a estados vizinhos, como a Paraíba, cujo índice caiu 10.3% frente a 3.8% no RN. “Isso nos leva a entender que eventos como este são importantes para o desenvolvimento econômico, mas precisamos de estratégias de longo prazo para sustentar esse crescimento e superar as adversidades”, avalia.
Para o presidente da ABIH, Abdon Gosson, o legado da copa foi “muito pouco” em todas as cidades-sede e aponta a falta de priorização do turismo pelos governos Federal e Estadual, além da falta de segurança e transporte público . “Nós não temos hoje aquela intenção fortemente provocada pela Copa para o turista do mundo em relação ao destino Brasil”, pontua.
Arena das Dunas diversificou atividades
Palco das partidas da Copa do Mundo realizadas no RN, o estádio Arena das Dunas, hoje chamado de Casa de Apostas Arena das Dunas, é uma das heranças deixadas pelo mundial. Seus gramados receberam quatro jogos da fase inicial com as seleções do México, Itália, Uruguai, Estados Unidos, Camarões, Japão, Grécia e Gana. Desde então, o equipamento se tornou espaço também para o entretenimento no formato de arena multiuso. Ao longo desses dez anos, o empreendimento contabiliza 1.949 dias de ocupação, 1.749 eventos, 343 partidas de futebol e um público total de 6,1 milhão de pessoas.
Ricardo Ferreira, diretor-presidente da Casa de Apostas Arena das Dunas, diz que, ao longo dos anos, foram aplicados investimentos em inovação, qualidade e excelência operacional. “A Arena das Dunas também é a única do país no segmento de Arenas Multiuso a possuir o selo internacional ISO 55001, que atesta sua excelência operacional na gestão e manutenção dos seus ativos”, explica.
De 2011 a 2020, o equipamento movimentou uma renda na ordem de R$ 1,4 bilhão. Os dados estão no relatório publicado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), em 2021. A geração de riqueza gerada pela movimentação econômica no Valor Bruto da Produção chegava a R$ 1,8 bilhão em alcance nacional.
Postos de trabalho
Já passaram pela Arena 42.360 profissionais autônomos, 470 colaboradores contratados e seguem ativos 100 postos de trabalho com 18 empresas de consultoria e modernos softwares de gestão. “O nosso objetivo é seguir explorando novas áreas comerciais, ampliando a atuação não apenas no número de eventos, mas também nas diversas outras frentes, como, por exemplo, na sua estrutura corporativa, onde teremos grandes novidades em breve”, antecipa Ricardo Ferreira.
Para quem deseja vivenciar e relembrar a experiência da Copa do Mundo em Natal, é possível contratar o “Arena Tour”, uma visita guiada que passeia pelos principais setores do estádio.
Deu na Tribuna do Norte