Abraão Lincoln foi desmoralizado em depoimento na CPMI do INSS

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O presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), o potiguar Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, prestou depoimento nesta segunda-feira (3) à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS, em Brasília, em uma sessão marcada por constrangimentos e pela desmoralização do depoente diante das perguntas do relator, deputado Alfredo Gaspar (União-AL).

Abraão Lincoln, que obteve habeas corpus preventivo do ministro Alexandre de Moraes (STF) para permanecer em silêncio sobre fatos que pudessem incriminá-lo, foi confrontado com uma série de questionamentos sobre sua trajetória política e jurídica. Gaspar fez um apanhado da vida do presidente da CBPA.

As perguntas diretas e incisivas deixaram o potiguar visivelmente acuado. Alfredo Gaspar também destacou o principal ponto da investigação atual: o número alarmante de mortos incluídos nas listas de descontos associativos vinculados à CBPA. “Há cerca de 40 mil mortos incluídos como filiados ativos”, frisou o relator, observando que esse número é recordista entre as entidades investigadas.

O relator lembrou inclusive a prisão de Abraão em 2015, em Porto Alegre: “O senhor já foi preso alguma vez?”, iniciou o relator. Diante do silêncio, prosseguiu: “Em 2015, Vossa Senhoria passou alguns meses guardado na penitenciária central de Porto Alegre. Pode me dizer o motivo da prisão? Essa prisão foi decorrente da cobrança de propina? Propina relacionada a licenças de pesca artesanal falsas?”. Abraão limitou-se a dizer que o caso “ainda está sob investigação” e que “não há condenação”.

Em meio aos questionamentos na CPMI, Gaspar ainda citou registros de visitas de Abraão Lincoln ao Palácio do Planalto, em julho e agosto, para reuniões com a ministra Gleisi Hoffmann e outros dirigentes sindicais de federações ligadas à Confederação, tratando da Medida Provisória 1303, que altera regras do seguro-defeso.

Mesmo com o direito de permanecer calado, Abraão respondeu pontualmente, tentando se desvincular das suspeitas. “Está sob investigação, mas não tenho nenhuma condenação”, ou “prefiro permanecer em silêncio”, repetiu em mais de uma ocasião. Inclusive, quando questionado sobre ligações com Antônio Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, e outros personagens ligados à investigação.

Em sua fala inicial, Abraão Lincoln tentou sustentar a legitimidade da confederação. Afirmou que a CBPA “nasceu de uma dissidência de doze federações históricas” e que hoje reúne 21 federações e quase mil entidades de base em todo o país. “Estamos aqui para dizer a vocês que existimos. Nossas instituições existem”, disse o dirigente, tentando rebater críticas sobre a estrutura física da entidade, descrita pela Controladoria-Geral da União (CGU) como uma “pequena sala comercial”, com apenas uma secretária e sem condições técnicas para atender mais de 360 mil associados.

Apesar da tentativa de defesa, o depoimento foi dominado pelas acusações levantadas pela CPMI e pela Polícia Federal. A CBPA é apontada como um dos eixos centrais da chamada Operação Sem Desconto, que investiga desvios de mais de R$ 220 milhões em benefícios previdenciários de aposentados e pensionistas. Segundo a PF, a confederação teria firmado convênios fraudulentos com o INSS, multiplicando artificialmente o número de filiados para obter repasses de recursos.

Relatórios da CGU e da Polícia Federal indicam que, embora a entidade não tivesse filiados em 2022, ela firmou acordo com o INSS e, em 2023, já contabilizava mais de 340 mil associados, movimentando R$ 57,8 milhões. Nos três primeiros meses de 2024, o número saltou para 445 mil, com faturamento de R$ 41,2 milhões. O documento também associa o tesoureiro da CBPA, Gabriel Negreiros, ex-candidato a vereador em Natal e considerado braço direito de Abraão Lincoln, aparece nos inquéritos como responsável financeiro da organização. Abraão Lincoln Ferreira, o presidente da CBPA, é ex-líder do Republicanos no Rio Grande do Norte e candidato a deputado federal em 2018. Ambos são investigados por suposta falsificação de filiações em massa e pagamento de propina a servidores do INSS.

A sessão foi acompanhada de forma atenta pelos membros da CPMI, que apura o esquema de descontos indevidos em benefícios previdenciários e suspeitas de corrupção no INSS. O presidente da comissão, senador Carlos Viana (Podemos-MG), manteve o tom institucional, mas o clima entre os parlamentares evidenciou a gravidade das acusações que cercam o dirigente potiguar.

A CPMI do INSS deve votar, nas próximas semanas, requerimentos de quebra de sigilo bancário e fiscal de Abraão Lincoln, abrangendo o período entre 2019 e 2025, além de detalhamentos sobre movimentações financeiras e contratos da CBPA. O caso, segundo o relator, “é um retrato de como organizações fantasmas têm saqueado o sistema previdenciário brasileiro, à custa de aposentados e pensionistas”.

Deu no Diário do RN

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