Drone desenvolvido na UFRN pode ser ferramenta para exploração em outros planetas

 

Tendo como principal diferencial ser equipado com uma tecnologia híbrida para a geração de energia, a qual permite sua utilização em grandes distâncias como uma possível locomoção até o planeta Marte, um grupo de inventores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) criou um drone. O mecanismo tem capacidade autônoma que concilia as características de uma asa voadora e um multirrotor com apenas um conjunto motopropulsor coaxial, ou seja, ora funciona como um avião, ora utiliza a lógica de funcionamento de um helicóptero, mas usando o mesmo conjunto de motores no voo.

Alysson Nascimento de Lucena identifica que somente essas duas características já conferem ao equipamento, tecnicamente um Veículo Aéreo Não Tripulado Híbrido (Vant), a capacidade de decolagem e pouso vertical pelo multirrotor e de deslocamento para longas distâncias em voo horizontal com sustentação pela asa. “Contudo, nesse projeto desenvolvemos uma tecnologia híbrida para a geração de energia, que pode ser tanto por células fotovoltaicas que cobrem a superfície superior da asa quanto pelo conjunto motopropulsor, também híbrido, capaz de gerar empuxo durante o voo ou gerar energia quando em repouso”, situa o hoje pós-doutorando no Programa de Pós-graduação de Engenharia Eletrônica e Computação no Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA).

Ainda segundo o pesquisador, o que dá capacidade ao conjunto motopropulsor para gerar energia é o controle de passo das hélices de cada motor. Esse comando permite, quando a aeronave estiver em repouso, posicionar uma pá perpendicularmente à direção do vento, enquanto a pá oposta está paralela, proporcionando melhor aproveitamento na geração de energia eólica.

“Esse Vant nos coloca em uma nova categoria de aplicação, a de longas distâncias por vários dias, devido a essa capacidade de recarregar a matriz energética. O tempo de operação está condicionado à vida útil da bateria e ela pode ser eficiente por anos. Essa característica nos possibilita operar em outros planetas, como Marte, bastando existir a oferta de ventos ou raios solares”, frisa Alysson Lucena.

Luiz Marcos Garcia Gonçalves, orientador do projeto quando do seu início, então vinculado aos programas de Pós-graduação em Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), explica que os dispositivos enviados para outros planetas normalmente geram energia somente por células fotovoltaicas. Nesse caso, o acúmulo de poeira é um problema que implica a diminuição da sua eficiência com o tempo.

Ele lista alguns exemplos. Um deles foi enfrentado pela Nasa, em 2021, quando a sonda InSight deixou de receber a energia necessária devido ao acúmulo de poeira nos painéis fotovoltaicos. Outra situação aconteceu recentemente, quando o Vant Ingenuity ficou sem contato com a base na Terra devido ao mesmo problema.
“A nossa tecnologia permite o recarregamento por meio das células fotovoltaicas e por energia eólica durante o tempo em que a aeronave permanece em repouso, evitando a falha da missão por falta de energia. Além disso, durante o voo vertical, o fluxo de ar incidente nos painéis fotovoltaicos que cobrem a asa atua fazendo uma faxina na poeira”, pontua o professor do Departamento de Engenharia de Computação e Automação.

Além dos dois, o desenvolvimento da tecnologia contou com as contribuições intelectuais de Neusa Maria Franco de Oliveira e Raimundo Carlos Silvério Freire Júnior. O depósito de pedido de patente aconteceu no mês de dezembro e recebeu o nome: Veículo aéreo não tripulado com sustentação híbrida e conjunto motopropulsor híbrido com hélice de passo variado para operação em atmosfera terrestre e não terrestre.

A tecnologia está na fase de elaboração do primeiro protótipo, mais precisamente no desenvolvimento do conjunto motopropulsor, que vai necessitar de usinagem de alta precisão para evitar folgas e vibrações. Paralelamente, os inventores estão trabalhando no sistema autônomo de controle da aeronave. Esses dois sistemas são os mais complexos para o projeto. Quando dominados, será o momento de os ensaios de voo ocorrerem.

“Os conhecimentos que estão sendo adquiridos no desenvolvimento do Vant híbrido no pós-doutorado em que estou agora serão muito importantes para a aeronave entrar em operação. Outro projeto em desenvolvimento com potencial de inovação é um Vant com asas de geometria variável”, destaca Alysson Lucena. O pós-doutorado citado é feito sob orientação da professora Neusa Franco e é fruto de uma chamada pública da Agência Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Uma mão cheia de patentes

Uma caminhada nordestina, recheada pela ânsia de criar, pelo voluntarismo e pela resiliência. As contribuições de Alysson na área da inovação aeroespacial dentro da UFRN merecem algumas linhas adicionais. Com outras quatro patentes depositadas, das quais duas já tiveram seu mérito analisado pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) e foram concedidas definitivamente, ir para São José dos Campos, cidade no estado de São Paulo que responde por mais de 90% da cadeia produtiva da indústria aeroespacial e de defesa no Brasil, pareceu ser o caminho natural. Ainda que típica, uma via que enseja sacrifícios a Myrtz Lucena e Gabriel Lucena, esposa e filho do pesquisador.

“Estou também trabalhando na Equatorial Sistemas, uma empresa do Grupo Akaer Engenharia, na qual estamos desenvolvendo um Vant híbrido VTOL com peso total de decolagem de 200 kg, que usará hidrogênio para a matriz energética. Esse projeto tem grande potencial inovativo, é uma subvenção da Finep e ocorre sob orientação de César Ghizoni, referência mundial na área aeroespacial, com frequentes palestras e consultorias na UFRN, tendo, inclusive, participado de fóruns para o Parque Tecnológico Augusto Severo, em Macaíba. Nisso tudo, fazendo uma alegoria com minha área, o suporte familiar é o motor que propulsiona minhas atividades e que mantém meu voo estável”, fala o engenheiro mecânico de formação.

Para ele, a Universidade tem papel fundamental nessa trajetória, sobretudo no patenteamento, pois, além de proporcionar o conhecimento para o desenvolvimento de novas tecnologias, oferece total apoio para que tudo seja feito de forma rápida e eficiente. “O processo é longo e necessita de pessoas especializadas e competentes e a UFRN nos oferece um trabalho de excelência por meio da sua Agência de Inovação (Agir), apoiando todas as etapas, desde a busca por anterioridade, passando pela produção de texto e figuras, depósito e acompanhamento, até chegarmos a concessão”, finaliza o inventor.

Deixe um comentário

Rolar para cima
× Receba Novidades