Os Estados aprovaram, por unanimidade, o congelamento do valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) cobrado nas vendas de combustíveis por 90 dias para mitigar a alta dos preços ao consumidor final, na bomba dos postos de gasolina. O secretário de Tributação do Rio Grande do Norte, Carlos Eduardo Xavier, fala que a medida representa, de início, uma renúncia fiscal, mas não há como estimar o impacto da nova regra na arrecadação, pois o preço e a demanda por gasolina continuarão variando.
“Como a gente congelou o preço em um patamar de R$ 6,62 e já encontramos nos postos de combustíveis a gasolina comercializada a R$ 7,30, há uma renúncia fiscal de R$ 0,70 por litro. No mais, tudo vai depender de como irá se comportar o mercado”, fala o secretário. Ele acrescenta que, se a política de precificação da Petrobras se mantiver e os preços seguirem subindo, a arrecadação dos Estados não irá acompanhar a tendência de alta.
Xavier ressalta que tanto os Estados quanto a sociedade como um todo têm consciência de que a causa da elevação dos preços não está relacionada com o ICMS, mas, mesmo assim, foi uma forma das unidades federativas atenderem ao pedido do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), contribuírem de alguma forma a dar um pouco de estabilidade aos preços dos combustíveis
O diretor institucional do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), André Horta, concorda que a medida funciona mais como um “gesto de solidariedade” ao consumidor do que uma solução para a elevação dos preços.
“O foco do problema está na Política de Paridade Internacional (PPI) adotada pela Petrobrás, uma medida que divorcia o preço de custo de se extrair o petróleo do que é cobrado ao consumidor”, opina.
Horta critica mais fortemente a PPI, dizendo que ela é feita “com o sacrifício da população brasileira” e interfere diretamente no modal de transportes rodoviários. “Não à toa, o congelamento do ICMS veio após o anúncio dos caminhoneiros para segunda-feira”, afirma Horta.
A decisão do congelamento foi tomada pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), colegiado que harmoniza as normas do ICMS, tributo cobrado pelos Estados, e conta com a presidência do Ministério da Economia.
Uma reunião extraordinária foi realizada no período da manhã desta sexta-feira. Segundo os representantes do Confaz, o objetivo é colaborar com a manutenção dos preços nos valores vigentes em 1º de novembro de 2021 até 31 de janeiro de 2022.
Na prática, com a decisão o preço base de incidência das alíquotas do ICMS praticadas pelos Estados fica congelado até final de janeiro, não importando o preço praticado pela Petrobras. Na regra atual, a atualização de preço médio é feita de 15 em 15 dias, alimentado a alta dos combustíveis.
A medida é uma tentativa dos Estados de ganharem tempo para que o projeto aprovado na Câmara, alterando a forma de cobrança, não passe no Senado jeito que foi aprovado pelos deputados.
A maioria dos Estados estava inflexível ao congelamento proposto pelos governos do Maranhão e de Minas Gerais, mas o quadro mudou com a pressão colocada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), que numa votação relâmpago em meados de outubro passou como um trator sobre os governadores e conseguiu aprovar o projeto com votação de 392 votos a favor e apenas 71 contrários.
Não deu tempo nem mesmo de os Estados fazerem uma mobilização. Lira comprou a campanha do presidente Jair Bolsonaro de colocar a culpa nos Estados pela alta dos preços.
O projeto, porém, é considerado inconstitucional pelos Estados por interferir na sua autonomia de legislar sobre o seu próprio tributo, além de ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que exige medidas compensatórias para renúncias de receitas.
Os governos regionais consideram que a aprovação do projeto foi uma resposta política e não econômica, que não resolverá o problema dos preços elevados dos combustíveis. A saída foi buscar a aprovação desse congelamento agora, que vinha sendo costurado pelo ex-secretário de Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, que pediu demissão e foi exonerado nesta sexta do cargo. Funchal presidia o Confaz.
Arrecadação terá superávit este ano, afirma IFI
A decisão dos Estados de congelar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis vai gerar prejuízo aos entes da federação. Desagrava a situação atual, contudo, o fato de que as contas estaduais estão relativamente saudáveis, e devem apresentar superávit nesse ano, impactadas pelas transferências feitas no ano passado e pela renegociação da dívida dos Estados. A avaliação é do diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado e especialista em contas públicas, Felipe Salto.
Nesta sexta, dados do setor público consolidado divulgados pelo Banco Central mostraram que os governos regionais – que incluem estados e municípios – tiveram em setembro o melhor resultado da série histórica, um superávit de R$ 10,439 bilhões.
Sozinhos, os Estados tiveram superávit de R$ 7,265 bilhões no mês. No acumulado em 12 meses, os entes da federação registram um resultado positivo de R$ 79,862 bilhões.
Para Salto, contudo, apesar de haver espaço para se discutir um melhor formato da tributação do ICMS sobre combustíveis, o problema que impacta o preço do combustível no bolso do consumidor hoje – causando ruído indesejado pré-eleições – é o câmbio.
“É claro que pode-se pensar em um modelo que fosse melhor de tributação do ICMS de combustíveis, porque hoje essa revisão de 15 em 15 dias acaba gerando uma volatilidade grande. Mas o problema hoje do combustível é a taxa de cambio. E está com essa pressão toda em razão dos desajustes e desarranjos da política fiscal. A mudança do teto e nos precatórios gera instabilidade que pressiona a taxa de câmbio e eleva os preços”, avaliou Salto.