Preso há 20 anos, Beira-Mar continua como chefe do Comando Vermelho, diz relatório

FOTO: REPRODUÇÃO

O histórico prisional de Luiz Fernando Moraes da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, nas penitenciárias federais aponta que o mesmo continua como chefe da facção Comando Vermelho, mesmo preso nesse sistema há quase 20 anos. O documento, produzido pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), com atualização anual, destaca que ele exerce influência negativa sobre os detentos, manipulando-os a partir de ajuda financeira, advocatícia e de saúde.

O EXTRA teve acesso com exclusividade ao histórico, que sintetiza a existência de relações entre os internos e da prática de crimes extramuros, apesar do rigor no monitoramento das unidades. Essa situação começou a ser contada ontem, no primeiro capítulo da série de reportagens Conexões do Crime, que explica como o Comando Vermelho tem criado alianças e expandido franquias Brasil afora para fazer frente ao Primeiro Comando da Capital.

Beira-Mar foi o primeiro detento do sistema penal federal, tendo inaugurado a unidade de Catanduvas, no Paraná, em 2006 — onde ficou sozinho por cerca de quatro meses até a chegada de presos de Pernambuco, Minas Gerais e Rondônia. No histórico prisional, uma informação de 2018, produzida pela inteligência da Senappen, garantia que, de 2014 a 2016, época em que esteve na penitenciária de Porto Velho, em Rondônia, ele continuava “cometendo crimes, burlando as rígidas regras de segurança das unidades federais” e utilizava “parentes, inclusive advogados, para dar continuidade a suas atividades criminosas”.

Ainda nesse período, bilhetes picotados e com assinatura de Beira-Mar foram encontrados por policiais penais federais dentro de marmitas, o que deflagrou, em 2017, a Operação Epístola, que teve como alvos parentes, comparsas e advogados ligados ao traficante. Por causa disso, ele foi transferido para Mossoró, no Rio Grande do Norte, onde passou a conviver com rivais. O relatório dessa época, inclusive, destaca que Beira-Mar “pôde se aproximar de chefe de facção rival enquanto esteve custodiado no isolamento da unidade, cumprindo RDD (regime mais rígido da legislação), e lá puderam conversar, dentre outros assuntos, sobre fabricação e venda de drogas bem como sobre a organização hierárquica das facções Comando Vermelho e Primeiro Comando da Capital”.

Nos anos seguintes, essa conduta se manteve mesmo com aumento na rigidez do sistema, que, em 2019, tornou o isolamento mais severo e ampliou o controle sobre as comunicações. O documento sinaliza que, em 2022, Beira-Mar continuava “custeando despesas advocatícias para outros presos da Penitenciária Federal de Campo Grande (onde estava naquele momento), especialmente seus aliados da facção Comando Vermelho” e articulava “negócios extramuros, com a ajuda de visitantes, advogados e outros presos”. Uma atualização em 2023 afirma que ele ainda exercia “liderança negativa perante os presos com quem convive” e apresentava “desgaste psicológico, devido ao longo período” no sistema.

Em resposta à publicação do primeiro capítulo da série Conexões do Crime, a Secretaria Nacional de Políticas Penais afirmou que “não há qualquer comunicação que não seja monitorada dentro de uma penitenciária federal, todas mediante autorização judicial, sendo as interações acompanhadas em tempo real por policiais penais federais, que atuam com elevado padrão técnico e estrito cumprimento da Lei de Execução Penal”. Além disso, destacou-se que “as penitenciárias federais foram criadas com o propósito de neutralizar a comunicação e a influência de lideranças criminosas, com base em isolamento individual, monitoramento integral e controle disciplinar rigoroso”. Leia nota aqui.

Órgãos de segurança pública fluminenses já identificam a presença de traficantes de 13 estados em territórios sob domínio do Comando Vermelho no Rio. O Pará é o principal deles, com 78 criminosos identificados pela Polícia Civil e escondidos nos grandes complexos cariocas. Nos últimos anos, a facção tem expandido negócios Brasil afora, fazendo frente à abrangência nacional do grupo paulista Primeiro Comando da Capital, como o EXTRA começou a explicar ontem, no primeiro capítulo da série Conexões do Crime.

Nos bastidores dessas novas negociações, aparecem as penitenciárias federais, que possibilitaram elos de traficantes pelo país, e a atuação de advogados criminosos, que usam a profissão para fazer trocas de recados entre traficantes, a chamada “sintonia”. Essa combinação ajudou o Comando Vermelho a abrir “franquias” em 25 estados e no Distrito Federal, além de transformar o Rio num espaço de intercâmbio, onde chefes da facção espalhados pelo Brasil ganharam blindagem e passaram a controlar territórios à distância, escondidos nos grandes complexos cariocas, o que deu estabilidade aos negócios.

Esse fenômeno também tem ampliado conexões entre delegados e chefes de investigações das polícias de todo o Brasil, para combater as migrações de traficantes. Grupos de WhatsApp foram criados para facilitar a comunicação entre eles, por onde são compartilhados paradeiros de criminosos, mandados de prisão em aberto e informações sobre mortes e guerras. Operações em conjunto também são realidade. No fim de setembro, uma ação das polícias Civil e Militar do Rio recebeu apoio do Pará contra o avanço do CV nas comunidades da Gardênia Azul e Cidade de Deus, na Zona Suduoeste da capital fluminense. Uma paraense apontada como soldado do tráfico e elo entre os dois estados foi presa.

Fonte: Extra

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