Motta adota rito que agiliza votação e pode beneficiar deputados alvos de processos

Foto: Mário Agra / Câmara dos Deputados

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), se aproveitou do ineditismo da matéria e definiu na última quarta-feira (8) o rito de discussão em plenário de pedidos de suspensão de ações penais contra deputados.

A suspensão de processos contra parlamentares é um direito previsto na Constituição, mas ainda não havia sido votado pela Casa.

Segundo a Constituição, o Senado ou a Câmara poderão analisar pedidos de sustação da ação penal de senadores e deputados, respectivamente, nos casos em que os crimes tiverem sido cometidos após a diplomação para seus cargos. A Constituição ainda estabelece o prazo de 45 dias para que a análise seja feita, a partir do recebimento da notificação da denúncia pelo Congresso.
Nesta semana, os deputados decidiram suspender uma ação penal aberta contra o ex-diretor da Abin e atual deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) por envolvimento na tentativa de golpe articulada pela gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Regimento desatualizado
Motta se baseou em normas semelhantes para definir o rito, já que a análise é inédita e que o artigo do regimento interno da Câmara que trata sobre ações penais contra deputados está desatualizado e não disciplina o procedimento de votação em plenário.

O dispositivo cita, por exemplo, “licença para instauração de processo” contra um parlamentar, o que não é mais usado. Atualmente, se o Supremo recebe a denúncia, o deputado vira réu sem precisar de autorização da Casa.

“Considerando que o Regimento Interno, que disciplina a apreciação da sustação de andamento de ação penal não faz qualquer menção à discussão em plenário, mas tão somente à aprovação de parecer pela CCJC, à inclusão na Ordem do Dia do plenário e, na sequência, ao resultado da votação; esta Presidência passa a definir o rito de apreciação da presente sustação de andamento de ação penal”, anunciou Motta antes da análise.

O rito pode beneficiar os parlamentares alvos de ações penais por limitar a obstrução e impedir a modificação do texto. Deputados governistas criticaram a medida. (leia mais abaixo)

Limitações
Antes do início da votação, Motta listou dispositivos regimentais que atribuem a ele o poder de “supervisionar os trabalhos da Casa e manter a ordem” e “organizar os trabalhos legislativos e otimizar o procedimento de apreciação das proposições”.

Na sequência, anunciou o rito:

impediu os deputados de apresentarem emendas e destaques ao texto, que havia sido aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Os dois instrumentos são formas de modificar o projeto encaminhado ao plenário;
pulou as fases de discussão e encaminhamento da matéria, períodos em que os líderes podem discursar;
proibiu a apresentação de requerimentos de adiamento de votação e de retirada de pauta, utilizados para obstruir a votação. Com isso, a análise do pedido foi agilizada.
‘Atropelos’
Os deputados criticaram o que consideraram um “rito sumário”.

“Aprovar esta matéria sem nenhuma discussão, que não a orientação dos partidos, parece-nos algo que ofende o caráter soberano do plenário. Esse toque de caixa, esse rito sumário é extremamente violento”, afirmou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ).

O deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) pediu que fosse aberto o período de discussão, quando os parlamentares podem se inscrever para falar na tribuna, o que não ocorreu.

“Uma matéria tão grave como esta, primeiro, não deveria nem ter sido trazida a plenário. Agora, se trazida, não pode estar sujeita a atropelos desta natureza”, disse Guilherme Boulos (PSOL-SP).

O rito também foi questionado pela deputada Natália Bonavides (PT-RN) durante e após a sessão. “O rito foi um atropelo e não houve base regimental para ser da forma que foi”, disse ao g1.

Segundo ela, a análise deveria ser feita por meio de uma resolução, permitindo debate e alterações por parte dos deputados em plenário. “Da forma como foi feito, impediu-se qualquer tipo de debate, qualquer proposta de emenda ao texto”, disse. “Não havia nenhum vazio normativo que permitisse esse atropelo.”

Ela afirma que o tempo reduzido para análise, de 45 dias previsto na Constituição, não justifica a redução dos trâmites legislativos. “Quem quer aprovar a suspensão deve buscar sua aprovação nesse tempo, seguindo as regras. Atropelar as prerrogativas regimentais dos deputados não deveria ser uma opção”, completou.

Deu no G1

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