Foto: Magnus Nascimento
Com o maior hospital público do Rio Grande do Norte operando em estado crítico de superlotação, com corredores lotados, a proposta da Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap) de criar uma barreira ortopédica para desafogar o Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel (HMWG) enfrenta dois grandes desafios: a falta de estrutura adequada nos hospitais avaliados para receber o serviço e a ausência de recursos financeiros para viabilizar o plano. A Sesap estima um custo mensal de R$ 900 mil, onde 40% seria bancado pelo Estado e 60% pelas prefeituras.
Enquanto hospitais municipais e regionais apresentam sérias limitações para absorver atendimentos de baixa e média complexidade, municípios alegam incapacidade de arcar com os custos, levando o Estado a solicitar apoio federal. A governadora Fátima Bezerra enviou ofício à ministra da Saúde Nísia Trindade solicitando apoio. “Estamos trabalhando no sentido de fazer um consórcio e já mantivemos contato com o Ministério da Saúde”, declarou Fátima. Sem a ajuda financeira, o plano pode se tornar inviável.
A criação de uma barreira ortopédica regional é uma das principais ações previstas no plano de contingência da Sesap para reduzir a superlotação do HMWG. De acordo com dados do órgão, 70% dos atendimentos no hospital são de baixa e média complexidade, o que compromete os leitos destinados a casos mais graves. Em 2023, o hospital atendeu uma média mensal de 847 pacientes na sala de ortopedia, sendo 32,31% desses internados, ocupando espaços que deveriam ser destinados a casos de alta complexidade.
Nos documentos enviados à Justiça e ao Ministério Público, a Sesap detalhou a situação. “Estamos vivendo um momento de colapso no maior hospital de politrauma do RN, muito às custas dessa entrada desordenada de pacientes que não são do perfil do Walfredo Gurgel. Isso se acumula há muitos anos”. A proposta da barreira ortopédica, conforme a Sesap, visa reordenar o fluxo desses pacientes para hospitais regionais, mas as visitas técnicas realizadas apontaram sérias limitações.
Visitas técnicas
A pasta montou uma comissão técnica para visitar potenciais unidades para abrigar a chamada barreira ortopédica. As visitas ocorreram no último dia 22 de novembro. Os três hospitais avaliados na Região Metropolitana de Natal — Hospital Belarmina Monte (São Gonçalo do Amarante), Hospital Café Filho (Extremoz) e Unidade Mista Márcio Marinho (Parnamirim) — apresentaram problemas estruturais que dificultam a implementação do plano.
O Hospital Belarmina Monte, identificado como a opção mais viável porque é o único com centro cirúrgico instalado, enfrenta superlotação e condições insalubres no pronto-socorro, descritas como desumanas pelos técnicos que fizeram a visita. O diretor da unidade, Geovani Freiras Neves, afirmou à Sesap que “no momento, há dois impedimentos que precisam ser superados: o início de uma obra prevista e a necessidade de dialogar com as gestões municipal e estadual”. Segundo a Sesap, o acesso de pacientes precisaria ser reorganizado para evitar impacto no funcionamento atual.
Na segunda unidade, embora tenha apresentado condições gerais razoáveis, o Hospital Café Filho, em Extremoz, não possui um centro cirúrgico, o que inviabilizaria sua utilização no curto prazo para casos de média complexidade. A Sesap identificou a necessidade de obras para adaptação da unidade, incluindo a construção de um centro cirúrgico, o que exigiria investimento financeiro e tempo. Apesar disso, o hospital foi avaliado como uma alternativa viável em médio prazo, com potencial para atender parte da demanda de forma regionalizada.
A situação do Hospital Márcio Marinho, em Parnamirim, foi avaliada como a mais crítica entre os hospitais visitados. A unidade enfrenta limitações severas, incluindo a falta de raio-x e o fechamento de 13 leitos devido à falta de recursos e contratos encerrados. Atualmente, o hospital está ocupado por laboratórios e repousos, sem capacidade de oferecer retaguarda cirúrgica. Apesar disso, a Sesap sugeriu que o espaço poderia ser utilizado para atendimentos ambulatoriais de baixíssima complexidade, voltados exclusivamente para casos que não demandem equipamentos ou infraestrutura avançada.
Estado recorre ao Governo Federal para financiamento
A proposta da barreira ortopédica não enfrenta apenas entraves estruturais. Mesmo que os ajustes necessários nas unidades hospitalares sejam realizados, o desafio financeiro continua sendo o principal obstáculo para a implementação do plano. A Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap) estima que o custo mensal do serviço seja de R$ 900 mil. Pelo modelo proposto, o Estado arcaria com 40% do custo total, enquanto os municípios cobertos pela barreira ortopédica assumiriam os 60% restantes.
Na parte das prefeituras, os valores seriam divididos proporcionalmente à demanda por atendimentos nas seis (ver box). Essa divisão, no entanto, enfrenta resistência por parte das administrações municipais e secretários de saúde. Em nota conjunta, a Federação dos Municípios (Femurn) e o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do RN (Cosems-RN) se posicionaram contra a ideia.
Isso fez com que a Sesap voltasse as apostas no apoio do Ministério da Saúde para superar o impasse . Em ofício enviado ao governo federal, a pasta solicitou recursos por meio do Programa Nacional de Redução de Filas de Cirurgias Eletivas, que poderia ajudar a custear os serviços ortopédicos. Além disso, o Estado busca a inclusão de novos materiais e procedimentos na tabela SUS, uma medida que poderia aliviar os custos elevados com órteses, próteses e materiais especiais (OPME).
“É imprescindível a organização da rede de atenção à saúde, extra rede hospitalar Sesap, deixando com os hospitais da Rede Sesap apenas as cirurgias que são exclusivas de alta complexidade, primeiro, porque assim o SUS ensina, e está na lei, e segundo, porque não há condições orçamentário-financeiras e nem de infraestrutura física nos serviços da rede Sesap para continuar do jeito que está. Não é porque sempre foi assim que suportaremos continuar assim”, diz trecho do documento assinado pela secretária Lyane Ramalho.
Deu na Tribuna do Norte