O ano de 2023 ficou marcado pelo retorno das invasões a propriedades públicas e privadas no campo e na cidade. No Rio Grande do Norte, foram, pelo menos, 8 invasões organizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Isso significa que ,apenas no primeiro ano do Governo Lula, o RN teve mais invasões a propriedades que nos quatro anos do Governo Bolsonaro inteiro. Entre 2019 e 2022, foram apenas cinco invasões de terra, de acordo com dados da Pastoral da Terra. A Pastoral ainda não dispõe dos dados do ano de 2023 inteiro, contudo é possível contabilizar o número de invasões a partir das publicações do próprio movimento. O panorama se repete em todo o País, com 2023 sendo um ano de recorde de invasões, segundo a CNA. Além disso, outras três invasões, em área urbana, foram registradas.
A recente invasão ao prédio do antigo jornal Diário de Natal, na Avenida Deodoro da Fonseca e que hoje pertence à empresa Poti Incorporações, levantou o alerta sobre o problema que eventualmente tem ocorrido no Estado. No interior, têm se tornado mais frequentes as invasões do MST, como as que foram denunciadas nos últimos dias pela Associação do Distrito de Irrigação Baixo Açu (Diba) em áreas pertencentes ao patrimônio do Estado, no Distrito de Irrigação Baixo Açu/Perímetro Irrigado Oswaldo Amorim, nos municípios de Alto do Rodrigues e Afonso Bezerra. Ou seja, o ano de 2024 também começou com invasões de propriedades privadas.
Em 2023, foram realizadas invasões do MST em diversas localidades do estado, como às margens da Usina São Francisco, no município de Ceará-Mirim; a um terreno da prefeitura de Macaíba; e à sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), em Natal.
Além disso, houve registros de invasões em áreas rurais públicas e privadas em municípios do interior, como em Carnaubais, Riachuelo, Ielmo Marinho e Mossoró. Um grupo independente também invadiu uma área do distrito industrial de São Gonçalo do Amarante.
Entre as reivindicações, são cobrados o assentamento de famílias e a desapropriação de terras. “O objetivo é de reivindicar o direito ao acesso à terra, moradia e dignidade humana, alertando os órgãos responsáveis para que realizem a desapropriação da área para fins de Reforma Agrária, assim como prevê a constituição brasileira, implementando a política de assentamentos em áreas improdutivas e que não cumprem sua função social”, explica o movimento.
Já as invasões urbanas cobram direito à moradia e estão espalhadas em várias localidades, especialmente na capital do estado. Em 2023, pelo menos duas novas ocorreram, sendo uma promovida por integrantes do Movimento de Mulheres Olga Benário no prédio da antiga faculdade de Economia, Contábeis e Atuariais da UFRN; e uma segunda invasão que fugiu do convencional e ocorreu num supermercado da zona Norte da capital.
Neste caso, o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) reivindicava doações de alimentos do estabelecimento. Eles alegam que se tratava de uma ação da campanha “Natal sem fome e sem miséria”, que ocorre anuamente.
O Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon/RN) tem se posicionado condenando o ato de invasões a propriedades privadas. “A gente condena veemente a invasão de propriedade, seja ela pública ou privada. Então, a questão da invasão de terra, acho que viola o que a gente chama dos direitos fundamentais da propriedade”, declara o presidente da entidade, Sérgio Azevedo.
Ele destaca que não se trata de ser insensível às causas sociais, nem ao direito à moradia. “O Sinduscon e acho que as outras federações, a sociedade de uma forma geral, podem colaborar com o debate, mas quem tem a obrigação de dar moradia, o interesse social, tem que partir do poder público”, pontua Azevedo.
O empresário Ricardo Abreu, da Abreu Imóveis, diz que as invasões levam insegurança ao investidor. “Fica inseguro não só em Natal, mas Parnamirim também tem várias invasões de aproveitadores. Não são pessoas que não têm casa. São pessoas que veem um terreno e decidem invadir porque a justiça é lenta e não há uma punição. Se o Estado é conivente com isso, ofereça suas terras para essas pessoas”, declarou.
Procurado, o Governo do Estado não retornou à solicitação da reportagem sobre como tem atuado para enfrentar a problemática das invasões de propriedade.
MST fez 71 invasões em todo o País, diz a CNA
O auge das invasões do MST em 2023 ocorreu no mês de abril, durante o que foi denominado como a 26° Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, que teve como lema: “Contra a Fome e a Escravidão: por Terra, Democracia e Meio Ambiente”, reafirmando a centralidade da luta pela terra no Brasil. Esse movimento se estendeu por todo o país, com a ocupação de propriedades rurais, resultando, na opinião da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em violência e insegurança para os proprietários dos terrenos invadidos.
Ao apresentar o balanço do setor em 2023 e as perspectivas para 2024, em dezembro passado, a CNA destacou que o cenário do setor agropecuário neste ano vai continuar sendo impactado por uma série de fatores, como as incertezas sobre o cumprimento da meta fiscal, aprovação da reforma tributária e o aumento da insegurança jurídica no campo provocada pelas invasões de terra.
“O produtor apesentou outros problemas que, teoricamente não deveríamos ter. E aí eu destaco a insegurança jurídica voltada às propriedades rurais que neste ano, até novembro, somam 71 invasões. O número é muito maior do que o que tivemos nos últimos quatro anos”, afirmou o diretor técnico da entidade, Bruno Lucchi.
Ao longo dos quatro anos que ele citou, que compreendem a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, foram 62 invasões de terras em todo o país. “É um problema, basicamente, que estava amenizado e voltou com mais força. Isso tirou o sossego de muitos produtores que, até mesmo na questão de investimentos, colocaram o pé no freio”, pontuou Bruno Lucchi.
O ato de invasão a uma propriedade privada, sob qualquer argumento, é crime previsto no Código Penal Brasileiro, nos artigos 161 e 202, que prevêem penas de um a três anos e multa. Já o artigo 184 da Constituição Federal diz que compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social.
Deu na Tribuna do Norte