Estatais no vermelho: sob Lula, empresas federais voltam a ter déficit

 

As estatais voltaram ao vermelho com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Chama atenção a rapidez da deterioração das contas das empresas federais em apenas um ano de mandato.

De acordo com o último relatório da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) (veja na íntegra), publicado em 22 de novembro, o prejuízo estimado para um conjunto de 22 empresas controladas pela União em 2023 é de R$ 4,5 bilhões. O valor é R$ 1,5 bilhão acima do autorizado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2023, que é de RS 3 bilhões.

Como o déficit será maior que o autorizado, o governo terá de compensar o excedente – com recursos públicos – pela primeira vez em oito anos.

Para economistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o aumento é revelador. “Foi muito rápido o estouro das contas. Fica bem nítida para todo mundo a execução de uma gestão, no mínimo, pouco responsável”, afirma Juliana Inhasz, economista do Insper.

O rol de empresas com projeção de déficit neste ano – conforme cálculos do governo a partir dos resultados até outubro – tem nomes como Correios, NAV Brasil, Hemobras e Indústrias Nucleares do Brasil (INB).

Os piores resultados primários esperados para 2023 são os da Emgepron (Empresa Gerencial de Projetos Navais, ligada à Marinha, com déficit de R$ 3,7 bilhões) e Eletronuclear (responsável pelas usinas de Angra dos Reis, com saldo negativo de R$ 1,4 bilhão).

O relatório também tem empresas no positivo, com destaque para Infraero (superávit esperado de R$ 732 milhões no ano) e ENBPar (controladora de Itaipu e Eletronuclear, com R$ 642 milhões).

Dentro do rombo de R$ 4,5 bilhões projetado pelo próprio governo não estão incluídos os resultados da Petrobras nem de empresas do setor financeiro, como Caixa e Banco do Brasil. Algumas empresas também tem contabilidades excluídas dos cálculos para a LDO, por critérios de investimentos estratégicos.

Economistas afirmam que os maus resultados do conjunto de empresas se devem principalmente ao elevado peso dos gastos com pessoal. “Há um sequestro político de parte das estatais, com inchaço de quadros não técnicos”, diz Inhasz.

Murilo Viana, especialista em contas públicas, destaca que algumas dessas empresas têm problemas crônicos de gestão, como os Correios, que tem o terceiro pior resultado projetado para o ano (déficit de R$ 274 milhões, segundo o relatório da SOF). “Ao longo dos anos houve uma deterioração das finanças e da gestão”, afirma Viana.

O governo de Jair Bolsonaro (PL) pretendia privatizar a estatal e chegou a obter o aval da Câmara, mas a proposta parou no Senado e depois, com a posse de Lula, foi abandonada de vez.

Para Marcelo Farias, presidente do Instituto Liberal de São Paulo (ILSP), o rombo atual não deveria surpreender porque traduz a essência de utilização o serviço público pelos apadrinhados e a natureza perdulária da gestão petista.

“O governo já iniciou o mandato com a perspectiva de gastar mais, como ficou claro com a PEC da Transição. Começou o mandato em déficit”, afirma.

Estatais tiveram superávit em 4 dos últimos 5 anos; déficit voltou em 2023

Segundo o Banco Central mostram que as empresas estatais federais foram superavitárias em quatro dos últimos cinco anos. A contabilidade do BC não inclui empresas dos grupos Petrobras e Eletrobras.

De 2018 para cá, o único déficit primário na estatística compilada pelo BC foi registrado em 2020, ano da pandemia, quando o saldo ficou negativo em R$ 614 milhões.

Anteriormente, essas empresas tiveram balanços deficitários em 11 de 12 anos – no intervalo de 2006 a 2017, só houve resultado primário positivo em 2011.

O dado mais recente do BC indica que as estatais federais acumularam déficit de R$ 263 milhões de janeiro a setembro deste ano. No mesmo intervalo de 2022, elas exibiam superávit de R$ 6,1 bilhões.

Resultado primário das empresas estatais federais (não inclui grupos Petrobras e Eletrobras). Fonte: Banco Central

2002 Superávit de R$ 1,454 bilhão
2003 Déficit de R$ 985 milhões
2004 Superávit de R$ 44 milhões
2005 Superávit de R$ 959 milhões
2006 Déficit de R$ 685 milhões
2007 Déficit de R$ 1,620 bilhão
2008 Déficit de R$ 418 milhões
2009 Déficit de R$ 1,609 bilhão
2010 Déficit de R$ 624 milhões
2011 Superávit de R$ 579 milhões
2012 Déficit de R$ 1,056 bilhão
2013 Déficit de R$ 544 milhões
2014 Déficit de R$ 2,008 bilhões
2015 Déficit de R$ 1,729 bilhão
2016 Déficit de R$ 836 milhões
2017 Déficit de R$ 952 milhões
2018 Superávit de R$ 3,466 bilhões
2019 Superávit de R$ 10,292 bilhões
2020 Déficit de R$ 614 milhões
2021 Superávit de R$ 3,030 bilhões
2022 Superávit de R$ 4,754 bilhões

Números acendem luzes de alerta sobre as estatais

Para especialistas, os números divulgados acendem luzes de alerta sobre as estatais. Eles veem falta transparência sobre a administração das empresas e seus investimentos. “Os balanços das empresas precisam ser melhor investigados”, acredita Viana.

O governo Lula deixou de publicar o Boletim das Empresas Estatais Federais, que era elaborado pela Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest).

O informativo trazia dados trimestrais sobre as empresas estatais federais, entre elas orçamentos, investimentos e aportes da União, além da evolução do quadro de pessoal e despesas. O último disponível no site da Sest é o relatório do 3.º trimestre de 2022, ainda no governo Bolsonaro.

“Sem dados confiáveis é difícil estabelecer a vigilância necessária. Talvez não haja interesse em divulgar para não mostrar a deterioração”, diz Inhaz.

Deu na Gazeta do Povo

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