Padre acusado de desvio milionário de dinheiro da saúde é preso

 

Foi preso na manhã desta sexta-feira, 17, Egídio de Carvalho Neto, conhecido como Padre Egídio. Ele é investigado por suspeita de desvio, na última década, de R$ 140 milhões em dinheiro público destinado à saúde. Sabendo do mandado de prisão, ele chegou a ir para a casa de seu advogado em Recife (PE), mas se entregou para as autoridades.

Procurado, o advogado José Rawilson Ferraz, que representa Padre Egídio, disse que vai recorrer da ordem prisional. O Grupo de Atuação no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) da Paraíba pediu a prisão preventiva de Padre Egídio e mais duas auxiliares dele no dia 29 de outubro. O desembargador Ricardo Vital, do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJ-PB), autorizou o cumprimento dos três mandados de prisão.

Amanda Duarte Silva Dantas, acusada de ser o braço-direito do religioso, foi colocada em prisão domiciliar por ser mãe de uma criança recém-nascida. Procurado, o advogado dela não se manifestou até a publicação desta reportagem. Jannyne Dantas Miranda e Silva ainda não foi encontrada pela Justiça e não tem advogado no processo. A reportagem busca contato com ela.

O caso começou a ser investigado em junho deste ano, quando o próprio Padre Egídio procurou a polícia para comunicar o furto de 600 aparelhos eletrônicos de dentro das dependências do Hospital Padre Zé, instituição filantrópica que ele comandava. Eram mercadorias apreendidas, doadas pela Receita Federal para que o estabelecimento pudesse arrecadar dinheiro com as vendas.

A polícia localizou alguns celulares furtados sendo vendidos nas redes sociais e viu indícios de que o crime teria ocorrido com a conivência do padre. De acordo com o Gaeco, ele se beneficiou de “parte dos valores conseguidos com a venda” dos equipamentos que foram furtados. O fato despertou as autoridades para investigar outros aspectos da vida financeira de Padre Egídio.

Patrimônio elevado

Quando a polícia começou a investigar o padre, descobriu que o gestor do Hospital Padre Zé tinha um patrimônio incompatível com o salário de R$ 15 mil que recebia da instituição. De acordo com o Geaco, Egídio é dono de 29 imóveis “de elevadíssimo padrão de construção” e, entre janeiro de 2021 e setembro de 2023, movimentou R$ 4,5 milhões na sua conta bancária.

Garrafas de bebidas apreendidas pela polícia em um dos 29 imóveis do Padre Egídio, preso nesta sexta-feira, 17
Garrafas de bebidas apreendidas pela polícia em um dos 29 imóveis do Padre Egídio, preso nesta sexta-feira, 17 Foto: Reprodução/TJ-PB

Ele é dono de dois carros de luxo e, em um dos seus imóveis, a polícia encontrou “um sem número de garrafas de bebidas alcoólicas que superam a média de mil reais por garrafa”. Padre Egídio também está pagando o curso de medicina de um sobrinho em uma universidade particular, cujas mensalidades ultrapassam os R$ 13 mil, segundo as investigações.

Confusão patrimonial

Cadernos, anotações e aparelhos celulares apreendidos pela polícia mostram diversas transferências bancárias feitas para a conta particular de Padre Egídio ou direcionadas a pagamentos que, segundo o Gaeco, teriam sido ordenados por ele. As anotações encontradas pelos agentes teriam sido feitas por Amanda Duarte Silva Dantas, que foi tesoureira do Instituto São José e do Hospital Padre Zé. Por isso, ela é suspeita de ser o braço direito de Egídio.

O caso ainda não tem denúncia e está em fase de investigação. Segundo a Promotoria, os documentos apreendidos “apontam para uma absoluta e completa confusão patrimonial entre os bens e valores de propriedade das referidas pessoas jurídicas (o hospital e o instituto), e aqueles atribuídos a Egídio de Carvalho Neto”.

Cadernos e anotações apreendidos pela Polícia mostram anotações que teriam sido feitas por Amanda Duarte Silva Dantas, registrando os supostos valores transferidos para Padre Egídio e os pagamentos supostamente feitos a pedido dele
Cadernos e anotações apreendidos pela Polícia mostram anotações que teriam sido feitas por Amanda Duarte Silva Dantas, registrando os supostos valores transferidos para Padre Egídio e os pagamentos supostamente feitos a pedido dele Foto: Reprodução/TJ-PB

Uma das despesas supostamente pagas com dinheiro do hospital que consta no pedido do Gaeco reúne várias compras de “itens de antiquário especializado em arte sacra, os quais até agora somam R$ 358,5 mil”. Os artefatos teriam ido para decoração dos imóveis do padre.

As investigações preliminares feitas pelo Ministério Público afirma, que Amanda Dantas “realizava pagamentos e demais movimentações bancárias do Hospital Padre Zé para a conta pessoal de Egídio” e que ela “sacava dinheiro em espécie para realizar pagamentos ‘na boca do caixa’ de diversos boletos e obrigações de Egídio”. O modus operandi teria “o objetivo de mascarar, dificultar e romper o ‘paper trail’ (rastro) do dinheiro”.

De acordo com o Gaeco, Jannyne Dantas Miranda e Silva, que foi diretora administrativa do hospital e membro do Conselho Deliberativo do Instituto, “integrou-se nos fazeres de Egídio e Amanda, deixando de se manifestar em casos de sua competência como diretora administrativa”. O MP menciona dois casos – de um carro supostamente comprado para o padre com dinheiro do hospital e de 38 monitores médicos adquiridos e não entregues – em que ela pode ter se beneficiado.

Atual diretor diz que Hospital gerido por Padre Egídio tem dívida milionária

O atual gestor do hospital encaminhou ao Gaeco um ofício no dia 16 de outubro mostrando a situação financeira da instituição filantrópica. O Padre George Batista Pereira Filho, diretor presidente do Hospital Padre Zé e do Instituto São José, mantenedor da entidade, afirma que o hospital deve R$ 2,3 milhões e que esse valor é incompatível com a entrada de recursos registrada na gestão de Padre Edígio.

Ofício enviado pela atual gestão do Hospital Padre Zé e pela instituição mantenedora aponta dívida de mais de R$ 2 milhões
Ofício enviado pela atual gestão do Hospital Padre Zé e pela instituição mantenedora aponta dívida de mais de R$ 2 milhões Foto: Reprodução/TJ-PB

No documento consta que, entre dezembro de 2022 e setembro de 2023, o hospital recebeu R$ 16,1 milhões em convênios com o Estado da Paraíba. Além disso, Pereira Filho enumera três empréstimos. Dois de R$ 4,9 e R$ 7 milhões, feitos junto à Caixa Econômica Federal (CEF) em junho e agosto de 2022. O terceiro, no Santander, é de R$ 455 mil, feito em junho deste ano.

“Até o presente momento, não se identificou o que motivou a realização de empréstimos tão vultosos e qual foi o destino dado aos valores recebidos, pois esses valores não se encontram nas contas correntes do Instituto São José”, afirmou o novo diretor. De acordo com ele, o custo mensal de manutenção do Hospital Padre Zé oscila entre R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão. Nas redes sociais, a entidade está pedindo doações para se manter.

Deu no G1

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