Existe um tempo máximo para o cochilo diurno? A ciência sugere que sim

Cochilos diurnos têm sido objeto de diversos trabalhos científicos nos últimos anos

 

Um hábito em diversos países, incluindo o Brasil, a soneca no meio do dia, geralmente após o almoço, por muito tempo foi associada a uma boa qualidade de vida. No entanto, estudos publicados nos últimos anos sugerem que exagerar no sono diurno pode trazer mais problemas do que benefícios.

Historicamente, moradores de locais conhecidos pela longevidade de seus cidadãos — Okinawa (Japão), Sardenha (Itália) e Icária (Grécia), por exemplo — costumam incluir uma soneca em sua rotina.

Em 2001, um estudo publicado na revista Psychiatry and Clinical Neurosciences examinou a saúde do sono e o estilo de vida de 788 idosos, entre 60 e 93 anos, residentes na província de Okinawa.

Os resultados mostraram que a prática de exercícios físicos, caminhadas e cochilos curtos (menos de hora) foram importantes para a manutenção e melhoria da saúde do sono à noite.

Entretanto, estudos mais recentes associam os cochilos, especialmente aqueles mais longos, a uma série de problemas de saúde.

Em um artigo publicado na revista Sleep Health em 2020, pesquisadores investigaram a associação entre sonecas diárias e SM (síndrome metabólica), caracterizada por uma grande circunferência abdominal (devido à gordura abdominal excessiva), hipertensão arterial, resistência aos efeitos da insulina ou diabetes, além de níveis anormais de colesterol e outras gorduras no sangue (dislipidemia).

O estudo incluiu mais de 9.600 participantes e descobriu que aqueles que tiravam sonecas diariamente tinham maior probabilidade de ter SM em comparação com aqueles que não o faziam.

Os pesquisadores também observaram maior risco de obesidade, altos níveis de triglicerídeos e diabetes ou glicemia de jejum alterada em indivíduos que tiravam sonecas diárias.

“As razões para essa associação entre sonecas diárias e síndrome metabólica não estão claras. As sonecas diárias também podem estar associadas à resistência à insulina devido ao aumento nos níveis de cortisol [hormônio liberado em situações de estresse] e à perturbação do ritmo circadiano [relógio biológico]. Além disso, foi demonstrado que após a soneca ocorre uma ativação do sistema nervoso simpático, o que pode aumentar a frequência cardíaca e a pressão arterial”, escreveram os autores.

Cientistas também investigaram a relação entre a frequência dos cochilos diurnos e a incidência de hipertensão e AVC (acidente vascular cerebral).

Em um artigo publicado na revista Hypertension no ano passado, eles apresentaram evidências consistentes que sugerem que as sonecas diurnas frequentes podem ser um potencial fator de risco causal para hipertensão e AVC isquêmico em indivíduos europeus de meia-idade.

“Embora tirar uma soneca em si não seja prejudicial, muitas pessoas que tiram sonecas podem fazê-lo por causa do sono ruim à noite. Dormir mal à noite está associado a problemas de saúde, e cochilos não são suficientes para compensar isso”, explicou o especialista em sono Michael A. Grandner, diretor do Programa de Pesquisa em Saúde do Sono e da Clínica de Medicina do Sono Comportamental e professor de psiquiatria da Universidade do Arizona, em Tucson, nos Estados Unidos.

Diversos trabalhos científicos publicados nos últimos anos focam um ponto específico que envolve as sonecas diurnas: a duração.

Em outro artigo, divulgado na Sleep Health em 2013, pesquisadores na China investigaram como as sonecas da tarde podem afetar a saúde de pessoas idosas.

Mesmo após considerados demais fatores que poderiam influenciar os resultados, como idade, sexo e outros problemas de saúde, ainda se constatou que sonecas muito longas (mais de 60 minutos) estavam associadas a um maior risco de glicemia de jejum alterada e que sonecas longas (mais de 30 minutos) apresentavam um maior risco de desenvolvimento do diabetes tipo 2.

Isso sugere, segundo os cientistas, que cochilos vespertinos superiores a uma hora podem ser um novo fator de risco para diabetes e níveis elevados de açúcar no sangue.

Na região da Múrcia, na Espanha, país conhecido pelo hábito da sesta, pesquisadores estudaram dados de 3.275 adultos com o objetivo de analisar a relação entre sonecas e obesidade.

Os indivíduos tiveram informações de saúde e estilo de vida coletados, bem como foram divididos em grupos que não cochilavam durante o dia ou que cochilavam, que cochilavam menos de 30 minutos e mais de 30 minutos (classificado como soneca longa).

No fim da pesquisa, observou-se que os que faziam sestas longas tinham um IMC (índice de massa corporal) mais alto e eram mais propensos a ter síndrome metabólica em comparação com os que não dormiam.

Já os que tinham por hábito os chamados “cochilos de energia”, de menos de meia hora, também não tiveram risco aumentado dessas duas condições.

Uma relação possível sugerida pelos pesquisadores foi a de que longas sonecas estavam associadas a horários de dormir e comer mais tarde, maior ingestão calórica no almoço e tabagismo.

Outro fator observado foi o local onde a sesta ocorria. Pessoas que dormiam na cama, em vez de no sofá, também ultrapassavam com mais facilidade os 30 minutos.

Os resultados sugerem a importância da duração da sesta no tratamento da obesidade e da síndrome metabólica.

Na província chinesa de Zhejiang, pesquisadores se debruçaram no estudo da mesma relação entre os cochilos durante o dia e doenças metabólicas.

O artigo, publicado no European Journal of Clinical Nutrition em 2020, detalha os achados após a análise dos dados de 3.236 participantes, que foram categorizados em quatro grupos de acordo com a duração dos cochilos.

Os resultados mostraram que cochilos curtos estavam associados a uma redução na prevalência de doenças metabólicas, como esteatose hepática (gordura no fígado), dislipidemia e obesidade central.

Por outro lado, sonecas longas (mais de uma hora) foram relacionadas a uma maior prevalência de diabetes, especialmente em mulheres acima de 50 anos.

Os idosos tendem a ser uma parcela da população mais propensa a adotar o hábito de dormir depois do almoço. E exatamente esse grupo foi objeto de um estudo realizado nos Estados Unidos e publicado no ano passado no Jornal da Associação de Alzheimer.

Pesquisadores do Brigham and Women’s Hospital, em Boston, perceberam que longas sonecas durante o dia previam um risco futuro aumentado de Alzheimer, mas que também um diagnóstico da doença predispôs a mais cochilos diurnos.

“Nossos resultados não apenas sugerem que cochilos diurnos excessivos podem sinalizar um risco elevado de demência de Alzheimer, mas também mostram que o aumento anual mais rápido de cochilos diurnos pode ser um sinal de deterioração ou progressão clínica desfavorável da doença”, disse em comunicado um dos autores do estudo, o pesquisador Peng Li.

Os resultados sugerem que cochilos curtos podem ser benéficos para a saúde, enquanto cochilos longos podem ser prejudiciais.

Especialistas recomendam não substituir o sono noturno pelo diurno. Se você estiver dormindo bem, de seis a oito horas por noite, acordando revigorado no dia seguinte, e ainda assim quiser tirar um cochilo após o almoço, é importante que ele dure entre 20 e 30 minutos.

Deu no R7

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