Começa neste sábado (30) a cúpula anual do G20, grupo formado pelas maiores economias do mundo, em Roma, na Itália. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e outros líderes, como o presidente americano, Joe Biden, desembarcaram na sexta-feira (29) na capital italiana.
As pautas principais são a recuperação da economia mundial, a contenção da pandemia e as preocupações com as mudanças climáticas – nesse último ponto, o G20 é uma prévia da COP26, a cúpula do clima das Nações Unidas, que começa neste domingo (31) em Glasgow, na Escócia.
Em Roma, os representantes do G20 poderão participar de três painéis: “Economia e Saúde Global”, no sábado; e “Mudança Climática e Meio Ambiente” e “Desenvolvimento Sustentável”, ambos no domingo. A cúpula também promove outros debates secundários e é uma oportunidade de realização de reuniões bilaterais entre os líderes.
O G20 foi criado em 1999, reunindo as 19 maiores economias do mundo e a União Europeia. As cúpulas anuais acontecem desde 2008, com a presença de chefes de Estado ou de Governo.
O grupo é composto por: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Turquia e União Europeia. Essas nações somam cerca de 60% da população mundial, 80% do PIB global e são responsáveis por 75% do comércio em todo o mundo.
Bolsonaro vai ao G20, mas fica fora da COP 26
O Brasil está representado pelo presidente Jair Bolsonaro e os ministros da Economia, Paulo Guedes, e das Relações Exteriores, Carlos França. A agenda de Bolsonaro, no entanto, destoa de outros líderes do G20, que deixarão o evento no domingo para ir à COP26, onde a questão das mudanças climáticas será aprofundada.
O presidente brasileiro não irá para a cúpula de Glasgow. O país será representado pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, enquanto Bolsonaro cumprirá outros compromissos na Itália.
Depois da cúpula G20, Bolsonaro visita, na segunda-feira (1º), a cidade de Anguillara Veneta, local onde viveu seu bisavô e onde há uma homenagem programada para o presidente brasileiro, que deverá receber o título de cidadão honorário. No dia seguinte, Bolsonaro participa de uma cerimônia, em Pistoia, em memória aos militares brasileiros mortos na Segunda Guerra Mundial.
O que esperar da cúpula
Ao contrário de outras organizações intergovernamentais, como aquelas ligadas às Nações Unidas, o fórum do G20 não conta com um secretariado permanente e é visto como mais informal, sem grandes decisões ou acordos em relação à agenda global.
Mesmo assim, as reuniões indicam “para onde os ventos da política internacional estão soprando”, segundo a definição de Carolina Moehlecke, professora da escola de Relações Internacionais da FGV (Fundação Getúlio Vargas). “Na cúpula, observamos a direção que a economia mundial vai rumar.”
De acordo com Laerte Apolinário Júnior, professor de Relações Internacionais da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo, a informalidade do fórum, que poderia representar uma certa fraqueza para a cúpula, também pode ser um ponto forte. “Para os líderes, é uma oportunidade de discutir diversos temas de forma menos amarrada, em comparação com outras organizações internacionais, e avançar em pautas específicas.”
O encontro atual coloca em debate assuntos cuja urgência é reconhecida por grande parte dos líderes. Mas a tensão deverá ser palpável, visto que cada país tem as suas próprias demandas nos três temas principais: recuperação da economia mundial, contenção da pandemia e mudanças climáticas.
“Há discussão sobre quais políticas devem ser priorizadas nessa questão das mudanças climáticas. O carvão é muito poluente, mas é a base da matriz energética da China e tem muita importância para países como Rússia e Índia. Enquanto isso, os governos menos dependentes do carvão podem bater nessa tecla [de redução do uso do carvão]”, diz Carolina Moehlecke.
Resoluções em conflito
Segundo a professora, outro ponto contencioso da cúpula é que as políticas que atendem às mudanças climáticas e à recuperação econômica no contexto da pandemia tendem a colidir.
“A utilização do petróleo é extremamente prejudicial para o meio ambiente. Mas é muito difícil para um governo, agora, incentivar uma mudança para uma matriz mais limpa colocando o preço do petróleo lá em cima. Num momento de recuperação econômica, é péssimo ter preços altos do combustível, como já está acontecendo agora”, pontua a professora. “Há muitos dilemas nessas conversas sobre pandemia, recuperação econômica e mudanças climáticas. As tensões devem aparecer, e não espero muito progresso.”
Ainda assim, há expectativa de que os líderes do G20 possam chegar a um consenso mínimo sobre a questão das mudanças climáticas antes de discutir esse assunto de forma mais ampla na COP26. “Hoje, não estamos numa boa situação no que diz respeito ao cumprimento das metas de controle de emissão estabelecidas no Acordo de Paris de 2015. Esse caráter mais informal da reunião do G20 pode ajudar os líderes a abordar esse assunto com uma liberdade maior”, afirma Laerte Apolinário.
Para ele, o G20 também pode buscar um consenso em relação à contenção da pandemia, com um possível acordo de assistência aos países em desenvolvimento, que não tiveram o mesmo acesso às vacinas e ainda estão muito atrás em suas campanhas de imunização. “As esperanças, no entanto, não são grandes, levando em conta os interesses divergentes dos países do G20”, ressalta.
Participação do Brasil
A ausência de Bolsonaro na COP26 é um dos pontos, segundo os especialistas, que ilustram a situação atual de isolamento do Brasil em relação aos outros países. “As lideranças vão emendar os dois encontros, enquanto o presidente Bolsonaro cumprirá uma agenda doméstica na Itália. É simbólico”, diz Laerte Apolinário.
Segundo o especialista, a delegação brasileira chega à cúpula desacreditada e com baixa credibilidade. Ele cita o fato de Bolsonaro ser o único líder do G20 que não se vacinou como outro ponto negativo para a imagem do Brasil na reunião. “Há uma grande desigualdade, entre os países, em relação ao acesso às vacinas. E o presidente brasileiro chega nessa negociação como alguém que teve a oportunidade de se vacinar, mas escolheu não fazer isso. Enquanto isso, bilhões de pessoas não têm acesso aos imunizantes.”
Carolina Moehlecke destaca o fato de o Brasil chegar à cúpula do G20 com um novo chanceler, Carlos França, que é mais moderado do que seu antecessor, Ernesto Araújo. “A postura dele deve ser menos improdutiva, porque o ex-chanceler Ernesto criava tensões desnecessárias e dificultava as negociações”, aponta.
Mesmo com um tom mais ameno, a professora não tem expectativas de uma participação contundente do Brasil na cúpula. “A postura é mais moderada, o que não significa que ela seja produtiva. Ela usa os termos corretos da diplomacia, mas é pouco propositiva.”
“Infelizmente, o Brasil tem perdido a oportunidade de aproveitar esses grandes eventos multilaterais para tratar dos temas importantes para o país. O presidente e sua comitiva ficam mais preocupados em participar de eventos e tirar fotos que agradam suas bases do que em efetivamente usar a cúpula pra construir relações para o país”, conclui a professora.
Deu na CNN Brasil