Moraes exige arrependimento e predição de “condutas futuras” para soltar Daniel Silveira

O ex-parlamentar tem conduta “excelente” na prisão, recebeu exame criminológico favorável e já afirmou estar arrependido, mas Moraes negou a progressão| Foto: Fellipe Sampaio /STF e Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

 

Depois de cobrar multa de R$ 270 mil para soltar Daniel Silveira e solicitar exame criminológico que, segundo o Código Penal, só pode ser exigido para quem foi preso após a lei entrar em vigor, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), recebeu laudo positivo do exame, e não aceitou.

Em vez de acatar a progressão de regime que, nesta sexta-feira (27), já ultrapassou em 147 dias o total exigido pela Constituição, Moraes determinou novas exigências, como predição das condutas futuras de Silveira, imposição de arrependimento acerca dos crimes cometidos e questionamentos aos especialistas responsáveis pelo laudo criminológico. A decisão do ministro foi assinada na última segunda-feira (23).

Procurado pela Gazeta do Povo, o jurista Rodrigo Chemim, doutor em Direito de Estado, explica que a Lei de Execuções Penais, no artigo 112, coloca como condição apenas a “boa conduta carcerária” para conceder progressão de regime a um preso. Para isso, o quesito deve ser “comprovado pelo diretor do estabelecimento e pelos resultados do exame criminológico”.

A reportagem teve acesso à íntegra do relatório encaminhado ao ministro pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap-RJ) e verificou que a avaliação de comportamento do ex-deputado federal no presídio Bangu 8 passou de “ótima” em fevereiro deste ano para “excelente”, em agosto.

A equipe também leu o exame criminológico, que apresentou laudos emitidos por profissionais do Seap-RJ especializados nas áreas de psicologia, assistência social e psiquiatria, com parecer positivo à progressão.

“Avaliamos que não há, no momento, fator impeditivo à concessão do benefício pleiteado, sob o ponto de vista psiquiátrico”, afirma o laudo assinado por uma médica do Hospital Penal Psiquiátrico Roberto Medeiros no dia 3 de setembro.

”Ressaltando que este exame não tem a pretensão de predizer conduta futura, sendo um corte transversal no histórico do interno, avaliamos que não há, no momento, fator
impeditivo à concessão do benefício pleiteado, sob o ponto de vista psiquiátrico.
Rio de Janeiro, 03/09/2024.”

Moraes caracterizou o exame como “extremamente superficial”

No entanto, o ministro não aceitou o resultado, afirmando que o exame foi “extremamente superficial”. Para o ministro, as informações não poderiam ser coletadas em uma única entrevista de cada profissional com o condenado, e ele afirma que as conclusões não relataram como serão as ações de Silveira fora da prisão.

“Observa-se a ausência de prognose relacionada às condutas futuras do sentenciado, característica essencial de qualquer exame criminológico”, afirmou o magistrado em sua decisão, citando trecho do doutor em psicologia clínica Alvino Augusto de Sá descrito no livro “Criminologia”, do desembargador Guilherme Souza Nucci.

No texto, o autor aponta que os exames criminológicos devem apresentar um prognóstico a respeito do detento, no qual “os técnicos expõem sua pressuposição sobre os possíveis desdobramentos futuros da conduta do examinando”.

“Não há ferramentas psiquiátricas para prever se o indivíduo voltará a cometer um crime”

No entanto, o psiquiatra forense Carlos Augusto Loyola explica que isso não significa uma “previsão do futuro”, pois a avaliação descrita no laudo costuma ser pontual, baseada no histórico do condenado durante a detenção, em diagnósticos anteriores e na entrevista.

“Não há ferramentas psiquiátricas para prever se o indivíduo voltará a cometer um crime”, garante, apontando que, em 20 anos como perito judicial, nunca viu um magistrado negar laudo pericial positivo para um caso sem violência física. “Pedidos de aprofundamento costumam ocorrer em situações de crimes bárbaros para comprovar se há algum grau de psicopatologia com necessidade de tratamento medicamentoso”, aponta.

Para pedidos de progressão de pena que não envolvam psicopatas ou criminosos recorrentes, o especialista aponta que é realizada análise do histórico do preso e uma entrevista com assistente social, psicólogo e psiquiatra. Isso é “suficiente para emitir um parecer com segurança”, afirma.

Em nota, a Seap-RJ informa que o exame criminológico de Daniel Silveira seguiu os critérios usados para todos os detentos, sendo realizado por “equipe multidisciplinar” e “garantindo imparcialidade e tratamento igualitário”. A Seap acrescentou ainda que cumpre todas as decisões judiciais e realizará o exame complementar solicitado.

Deu na Gazeta do Povo

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