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A Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais), segunda maior investigada na fraude no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), continua a captar associados enquanto é investigada pela PF (Polícia Federal).
A entidade realizou um treinamento online no fim de agosto para novos vendedores. O objetivo é buscar associados que topem pagar R$ 37 mensais. Quem conseguir um novo cliente fica com 10% da mensalidade como comissão, o equivalente a R$ 3,70.
A Conafer apresenta seu público-alvo como pessoas “de baixa renda e baixa consciência de mercado”. São elas: agricultores familiares, ribeirinhos, quilombolas, povos originários. Trabalhadores informais, autônomos, idosos, mães, jovens, famílias de baixa renda e sem plano de saúde.
No seu site, a entidade lista diversos benefícios para seus clientes, como R$ 200 para a compra de remédios, R$ 1.000 em caso de morte acidental e sorteios de R$ 10 mil mensais, entre outros.
Na página, há depoimentos de supostos clientes. Uma pessoa identificada como Julio Cesar Pataxó diz que, como liderança indígena, se sente respeitado e valorizado na Conafer. “Eles nos apoiam com seriedade, fortalecem nossa cultura e garantem espaço de fala nos debates nacionais”, escreveu.
Uma foto acompanha o depoimento. Em uma busca pela imagem na internet, é possível encontrar o mesmo retrato nos perfis de redes sociais de pessoas identificadas como Pedro Augusto Francisco Neto, Jorge Andrade e Luiz Gustavo Ribeiro, entre outros.
O mesmo acontece com as fotos do agricultor familiar Ricardo R. Ramos e da empreendedora Anne Roberta.
Apesar das fotos falsas, a entidade afirma em seu site que tem mais de 70 mil afiliados ativos em todo o Brasil. Em carta publicada em suas redes sociais em junho deste ano, ela afirmou ter 597,2 mil associados com vínculo válido e vigente.
Procurada, a Conafer não respondeu.
A CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) que apura o caso deve ouvir o presidente da entidade, Carlos Lopes, nesta segunda (29).
A Conafer é a segunda entidade com mais descontos associativos registrados no INSS, com R$ 484 milhões descontados entre 2019 e 2024, ficando atrás só da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), que recebeu R$ 2,1 bilhões no período.
Após a deflagração da Operação Sem Desconto pela Polícia Federal, o INSS bloqueou todos os descontos automáticos nos benefícios previdenciários, o que gerou problemas de caixa para a Conafer. A solução foi buscar novos clientes.
Antes dos problemas financeiros, a entidade mantinha a Frente Parlamentar em Defesa do Empreendedorismo Rural no Congresso. Ela pagava o aluguel da sede da frente, uma mansão no Lago Sul, e bancou gastos com café da manhã no lançamento do grupo de parlamentares, segundo informações obtidas pela Folha.
A vistoria do imóvel para a locação foi realizada em 28 de março do ano passado, e o lançamento da frente ocorreu menos de um mês depois, em 18 de abril.
A atuação da Conafer no Congresso ajudou a entidade a conseguir emendas parlamentares, que eram direcionadas ao Instituto Terra e Trabalho. Ao todo, foram R$ 14,5 milhões em empenhos em 2023 e 2024 a partir de emendas de seis parlamentares e duas bancadas. Desse total, R$ 9,3 milhões foram pagos.
Além disso, a instituição mantém uma segunda entidade que realizava descontos nas aposentadorias do INSS, a AAB (Associação de Aposentados do Brasil), que não está na lista de investigadas da PF.
Ela recebeu R$ 28 milhões em descontos em aposentadorias e pensões pagas pelo INSS entre agosto de 2024 e abril de 2025. Isso representa uma média mensal de R$ 3 milhões nesse período de nove meses.
Folha de S.Paulo