Brasil vira antagonista dos EUA na ONU no primeiro encontro cara a cara entre Lula e Trump

Foto: Reprodução

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve se converter no principal antagonista do presidente americano, Donald Trump, durante a abertura da 80ª Assembleia-Geral das Nações Unidas (ONU).

Essa é a primeira viagem oficial de Lula aos Estados Unidos desde a posse de Trump, em janeiro. Desde então, a relação do Palácio do Planalto com a Casa Branca piorou sensivelmente.

O presidente desembarcou na noite de domingo, dia 21, com uma comitiva mais enxuta que de costume e foi alvo de protestos de opositores . As atividades oficiais começam na manhã desta segunda-feira, dia 22.

Os presidentes poderão se encontrar cara a cara pela primeira vez nos corredores da ONU. Como de praxe, cabe ao Brasil fazer o discurso de abertura do Debate Geral da assembleia, na manhã de terça-feira, dia 23.

Crise na relação bilateral

Trump ocupará a tribuna logo após Lula encerrar seu pronunciamento. O governo brasileiro entende que os contrastes com Trump ficarão claros nos discursos de ambos.

Não há pedidos de conversa articulada entre eles. O governo Lula receia de gestos de humilhação ao presidente e pondera que o ambiente não é propício para uma discussão substantiva da relação bilateral, mas não descarta um aperto de mãos caso se cruzem no corredor. Lula deve assistir ao discurso de Trump no plenário.

Os mais experientes ex-embaixadores brasileiros em Washington, estudiosos da relação bilateral, classificaram o atual momento como o pior em 200 anos de relações diplomáticas. Ameaças de novas punições ao Brasil em virtude do apoio de Trump ao ex-presidente Jair Bolsonaro tendem a degradar ainda mais esse relacionamento e podem ser concretizadas durante a estada do petista nos EUA.

Esses diplomatas avaliam que Lula errou ao apoiar os democratas para sucessão de Joe Biden, mas concordam que o republicano praticou uma ingerência na política doméstica brasileira. Eles divergem sobre a conveniência de um contato direto e pessoal com Trump, como um telefonema.

Os diplomatas dos dois países não escondem que a divergência tem razão política. A Casa Branca insiste na tese de suposta defesa da liberdade de expressão por parte de Trump, que vê uma caça às bruxas na condenação de Bolsonaro, com quem ele se comparou, e na alegada perseguição às plataformas digitais – big techs.

O Planalto, porém, enxerga no tarifaço de 50% e na pressão por meio de sanções pessoais (corte de vistos e cerco financeiro da Lei Magnistky) a ministros do governo e do Supremo Tribunal Federal, sobretudo a Alexandre de Moraes, uma tentativa de ingerência nas eleições de 2026. Segundo essa leitura, Trump quer ver um governo “submisso” no maior país da América Latina, conter a esquerda e uma postura “insubordinada” de Lula no que consideram o “quintal” e zona de crescente influência geoeconômica da China.

De visões opostas sobre conflitos geopolíticos à emergência climática, passando pelo tarifaço global e pelo debate sobre regulação big techs, há uma série de pontos de choque entre os governos de Brasil e Estados Unidos.

Nos bastidores, existe o temor de que autoridades públicas brasileiras sejam alvo de novas sanções ou até mesmo que o País sofra com novas tarifas e sanções secundárias sobre a compra do diesel e fertilizantes russos. Caso se confirmem, Lula deve reagir já na tribuna da ONU.

Antes da Assembleia, o Departamento de Estado retardou a concessão de vistos diplomáticos e impôs restrições de locomoção a mais de um representante do governo brasileiro.

Impedido de circular livremente em NY e de ir a uma reunião de ministros da Saúde em Washington, como pretendia, Alexandre Padilha desistiu de viajar. Em carta, apontou obscurantismo e prejuízos potenciais ao País.

Integrantes da delegação brasileira que ocupam postos de menor escalão receberam a restrição de se locomoverem apenas em Nova York.

Como mostrou o Estadão, essa mesma restrição tem sido aplicada a regimes rivais dos EUA e autoritários: China, Rússia, Irã, Síria, Venezuela e Cuba.

Em vez de discutir o caso diretamente com o Departamento de Estado, o governo Lula tomou a iniciativa de escalar o que considera uma decisão arbitrária e descabida. Pediu intervenção do secretário-geral da ONU, António Guterres. O chanceler Mauro Vieira escreveu uma carta a Guterres.

O episódio não deve passar batido do discurso do petista. O presidente considera mencionar em tom de repúdio a restrição inédita à comitiva do Brasil e o banimento completo da delegação Palestina.

Estadão

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