Para o reitor da UFRN, José Daniel Diniz, os cortes acumulados produzem efeitos significativos | Foto: Acervo da TN
Universidades federais têm anunciado cortes emergenciais por causa de um decreto do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que limitou o uso mensal do orçamento das instituições. De maio a novembro, elas só poderão gastar pouco mais de 60% por mês do que o previsto no começo do ano. Algumas universidades restringiram o transporte interno dos alunos, cortaram combustível de seus carros e definiram uma ordem de prioridade de pagamento a partir da conta que estiver mais atrasada.
Diversas instituições temem que, se essa situação se prolongar, contratos de água, luz e a assistência estudantil sejam afetados.
As universidades vão receber, segundo levantamento do jornal O Globo, até novembro menos do que o previsto no começo do ano de um orçamento que, segundo elas, já é menor do que precisam. A Universidade Federal de Alagoas (Ufal), por exemplo, receberá R$ 4 milhões por mês tendo de pagar R$ 6 milhões em contas. Para funcionar de forma adequada, seriam necessários R$ 9 milhões, segundo a reitoria.
Referência no desenvolvimento de inteligência artificial na educação, a federal alagoana cortou 20% do contrato de limpeza e extinguiu a capina. Também precisou economizar na segurança.
A carga horária dos vigilantes foi reduzida e houve troca de vigilância armada. “Do jeito que está, a Ufal só sobrevive até setembro, porque a previsão de liberação dos outros 40% do orçamento só sairá a partir de novembro”, previu reitoria, em nota.
Na UFRJ, que tem uma dívida de R$ 61 milhões, é preciso escolher quais contas pagar. Estudantes e professores convivem com estruturas deterioradas, elevadores quebrados e aulas suspensas por falta de luz ou água. Segundo a Pró-Reitoria de Planejamento, o dinheiro para maio acabou antes da metade do mês.
Com o contingenciamento, foram adotados cortes em combustíveis, manutenção de veículos, passagens, diárias e na compra de materiais não essenciais para as aulas.
Professor da Faculdade de Farmácia, Mario Granda conta que as restrições já afetam o ensino. Aulas são canceladas, e algumas disciplinas deixaram de ser oferecidas por falta de estrutura.
“Na minha unidade, os professores deixaram de oferecer disciplinas eletivas por falta de espaço físico. Também temos designação de salas com capacidade inferior ao necessário, equipamentos de projeção danificado, ar-condicionado, quando existe, sem manutenção ou com mau funcionamento”, enumera.
A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) restringiu o uso do transporte interno na universidade e suspendeu a aquisição de equipamentos de informática. A Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba, uma das instituições de ensino superior que mais registra novas patentes no país, informou que vai priorizar contratos com maior atraso para serem pagos primeiros, e fará acordos de renegociação. O Cefet-MG suspendeu reformas em edifícios, a compra de insumos laboratoriais e de móveis.
De acordo com José Daniel Diniz Melo, reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), o decreto do governo federal faz com que uma parte importante dos recursos só seja liberada em dezembro. No entanto, diz, o maior volume de gastos das instituições precisa ser pago mês a mês.
“Os principais compromissos requerem pagamentos continuados ao longo de todo o ano, como assistência estudantil, bolsas acadêmicas de estudantes, contratos de limpeza, manutenção e segurança, restaurantes universitários, água e energia. Liberar parte do orçamento somente em dezembro inviabiliza a continuidade das atividades”, defende.
Segundo nota da Universidade Federal de Viçosa (UFV), ao mesmo tempo em que o decreto federal definiu que 36,72% do orçamento serão liberados apenas em dezembro, os empenhos de gastos por mês só podem ser feito até o dia 2.
“As instituições de ensino superior terão apenas dois dias para executar quase a metade de seu orçamento, o que é totalmente inviável”, afirma o comunicado.
Em nota, o MEC informou que as universidades sofrem os desgastes da redução de orçamento entre 2016 e 2022 e que “vem fazendo, desde 2023, um esforço consistente para recuperar” a verba para essas instituições. “O ministério trabalha para garantir a recomposição do orçamento das instituições federais de ensino superior de 2025 reduzido quando da aprovação pelo Congresso Nacional”, diz o comunicado.
Histórico de cortes pesa para as federais
Em 2025, estão previstos R$ 5,7 bilhões para as universidades federais de orçamento discricionário — aquele em que a instituição pode escolher onde gastar e cobre despesas com água, luz, manutenção, segurança, limpeza e bolsas. Esse valor é pouco mais da metade do que o disponível em 2011.
Nesse período, o país aumentou em 28% o número de estudantes, além de ter expandido territorialmente a oferta de cursos — assim como a implementação da Lei de Cotas, o que, de acordo com Melo, demanda mais dinheiro para apoiar estudantes com necessidades financeiras.
O orçamento de 2025 é menor do que o de 2024, considerando a inflação no período, e menos do que as universidades alegam precisar.
No começo do ano, a reivindicação delas era de R$ 7,81 bilhões, o mesmo patamar de 2019, com valores atualizados. De acordo com o presidente da Andifes, a situação se agrava porque os orçamentos foram menores entre 2020 e 2022.
“Os cortes acumulados continuam produzindo efeitos significativos, apesar de o Ministério da Educação ter realizado algumas recomposições orçamentárias nos últimos anos”, afirma.
No Rio, o Fórum de Reitores das Instituições Públicas de Educação vai recorrer aos deputados do estado para pedir ajustes no orçamento e emendas para as contas. Uma reunião foi marcada para segunda-feira.
Deu na Tribuna do Norte