Maíra Martini afirma que anulação de provas no Brasil está respingando em envolvidos em outros países. (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil / arquivo)
A nova CEO da ong Transparência Internacional, Maíra Martini, criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de anular as provas da delação premiada da Odebrecht no âmbito das investigações da Operação Lava Jato. A força-tarefa deflagrada em meados de 2014 passou a sofrer um desmonte que levou, anos depois, à anulação de provas principalmente pelo ministro Dias Toffoli.
Segundo ela, a medida pode comprometer investigações de corrupção em diversos países que fizeram acordos com o Brasil após envolvidos nas investigações confessarem crimes.
“Obviamente, os corruptos dos outros países já estão fazendo uso dessa decisão”, disse em entrevista à Folha de S. Paulo publicada nesta segunda (17).
A Odebrecht foi um dos pivôs do esquema de corrupção descoberto durante as investigações da Operação Lava Jato, inclusive com a operação de um setor que ficou conhecido como “departamento da propina” – ou, oficialmente, “Departamento de Operações Estruturadas”.
A empreiteira havia firmado um acordo de colaboração em 2016 com autoridades do Brasil, Suíça e Estados Unidos, confessando o pagamento de propina em 12 países. Em 2023, o ministro Dias Toffoli invalidou as provas sob o argumento de que houve conluio entre juiz e acusação, além do transporte irregular do material.
“O mais absurdo de tudo isso é que em algum desses casos, essas pessoas confessaram que elas estavam envolvidas em esquema de corrupção. E agora pode ser que elas acabem totalmente impunes”, criticou Martini.
Mais recentemente, investigados no Peru, Equador e outras nações tentam usar a decisão do magistrado para derrubar ações judiciais contra eles.
A executiva também questiona a abordagem punitivista no combate à corrupção, defendendo um modelo baseado em prevenção e detecção. De acordo com ela, é preciso um conjunto de circunstâncias ao mesmo tempo para levar ao enfrentamento.
“Você precisa de instituições fortes, de um arcabouço legal que não deixe brechas de entendimento. Precisa de um Judiciário competente e independente. E precisa de uma sociedade civil ativa, da imprensa ativa e com espaço para falar. Quando você não tem um desses elementos, não se fala em combate à corrupção”, ressaltou.
Ela também alertou sobre o uso da “narrativa anticorrupção” por governos populistas que, uma vez no poder, enfraquecem instituições, restringem a imprensa e dificultam a fiscalização. Para Martini, a transparência deve ser a prioridade:
“É preciso entender quem está conversando com quem no governo, quem está tentando influenciar. Como os gastos públicos estão sendo decididos, o que é prioridade, o que não é, quem tem subsídio, quem não tem. Tudo isso tem que ser informação aberta para o público, para os cidadãos também conseguirem avaliar”, completou.
Deu na Gazeta do Povo