“Sempre digo que a unidade prisional pode ter tudo que se imaginar de tecnologia, modelo construtivo adequado, porém, se não houver procedimento adequado nada disso tem valor. Mais importante do que se imagina é manter os protocolos e o cumprimento efetivo deles. Isso não vinha acontecendo, era uma questão cultural e enfrentamos e modificamos isso desde a primeira semana. Um exemplo: retomamos as revistas estruturais e pessoais diariamente. É uma das marcas do sistema federal”, apontou o secretário Nacional de Políticas Penais, André Garcia.
“Em Mossoró isso não vinha acontecendo. Fizemos reforço e revisão de todos os protocolos, mas eu digo: os protocolos eram muito bons, bem elaborados pelo sistema penitenciário federal, o problema era uma subcultura criada no local e que não se cumpria adequadamente sob uma justificativa que não era plausível”, acrescentou André Garcia.
Ainda segundo o secretário André Garcia, as falhas estruturais que resultaram na fuga de Mossoró foram sanadas, com a unidade tendo sido priorizada em medidas que foram aplicadas em todas as unidades federais.
“No inquérito policial, os elementos que temos até agora corroboram as investigações internas que foram feitas pela Senappen, que a fuga foi resultado de falhas estruturais, tecnológicas e procedimentais. A fuga se deu pela luminária, que foi reforçada, foi utilizado um instrumento retirado da estrutura das celas, que foi reforçado e eliminado em todas as celas da unidade. Tivemos problemas tecnológicos, especialmente na questão da iluminação e câmeras analógicas, que foram substituídas, repostas e acrescentadas nos pontos que a inteligência entendeu que seriam necessárias.”, disse o secretário Nacional de Políticas Penais, André Garcia.
A fuga
A fuga de Mossoró aconteceu no dia 14 de fevereiro de 2024, quando Rogério da Silva Mendonça e Deibson Cabral Nascimento, ambos ligados à facção Comando Vermelho, do Rio de Janeiro, escaparam durante a madrugada da quarta-feira de Cinzas.
Na ocasião, os dois presos estavam no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), e conseguiram escapar após arrancarem as luminárias para acessar um espaço chamado shaft, com dutos, rede elétrica e posterior acesso ao teto. Para abrir o buraco, eles chegaram a utilizar vergalhões de ferro expostos na estrutura física da cela. Uma vez na área externa, os presos conseguiram romper as cercas utilizando ferramentas de uma obra que ocorria na penitenciária.
A recaptura dos presos só veio acontecer 50 dias depois após uma intensa procura em regiões de mata e florestas em todo o Rio Grande do Norte e em outros estados. Foram pelo menos 500 agentes envolvidos, entre policiais militares, civis, federais e agentes penais federais, helicópteros, cães farejadores, drones, numa ação que custou pelo menos R$ 6 milhões aos cofres públicos, entre diárias operacionais e custeio.
Após a recaptura, ocorrida em Marabá no Pará, os presos foram trazidos de volta à Mossoró. No final do ano passado, os detentos foram transferidos para a Penitenciária Federal de Catanduvas, no Paraná. A transferência é um rito tradicional do sistema federal, ocorrendo sistematicamente.
O episódio foi o primeiro da história do Sistema Penitenciário Federal, criado há quase 20 anos com o intuito de desmembrar e separar células do crime organizado brasileiro. Prova disso é que nomes como Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, fundador do PCC, e Fernandinho Beira-Mar, um dos maiores narcotraficantes do Brasil, ficam presos em unidades federais.
Dobro de câmeras, iluminação e reforço em celas
A fuga em Mossoró descortinou uma série de problemas estruturais na unidade, como câmeras sem funcionar, iluminação falha e celas deterioradas. Na época, a TRIBUNA DO NORTE mostrou os alertas feitos por órgãos ao MJSP acerca dos problemas na unidade federal. Um ano após a fuga, a penitenciária recebeu investimentos em equipamentos, treinamento de policiais penais e a construção de uma muralha foi iniciada, tudo para evitar novas fugas.
“A principal diferença na unidade, que é o que faltou na época, é a questão dos procedimentos. Estamos bem seguros depois de um ano. O que faltou foi os policiais fazerem os procedimentos adequados. Um deles é entrar na cela duas vezes por dia. Nas outras eles até entravam, mas nessas celas específicas, o RDD, os policiais não estavam entrando. Tivemos capacitação, treinamentos, oficinas. Isso foi o principal. Na parte material, hoje o parque tecnológico de câmeras é outro. A tecnologia que existe hoje é três vezes o que existia antes. Houve também reestruturação na alvenaria desse local, com reforço na parte onde eles fugiram”, disse o corregedor interino do sistema penitenciário federal no Rio Grande do Norte, o juiz federal Hallison Bezerra. “Houve reforço estrutural nas celas onde os presos estavam”, acrescenta.
Num dos principais gargalos na época da fuga, as câmeras receberam reforço: são 194 atualmente, contra 75 na época da fuga. O MJSP disse que a unidade passou a contar com monitoramento da via de acesso (RN-015), controlada por três câmeras, sendo uma delas com tecnologia LPR que faz a leitura de placas. Foram investidos ainda R$ 530 mil em equipamentos eletrônicos para reforçar a segurança da Penitenciária Federal em Mossoró. São, ao todo, 730 itens ligados ao Circuito Fechado de Televisão (CFTV) – entre os quais câmeras, televisores, porteiros eletrônicos e até um drone.
Entre outros itens, a unidade de Mossoró ganhou 20 novas televisões de monitoramento, computadores novos, equipamentos para armazenagem de dados e 17 novas viaturas, que custaram cerca de R$ 3,9 milhões. Pelo menos 19 servidores foram direcionados para Mossoró.
Segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, a construção da muralha no perímetro externo da PFMOS está em andamento, após a conclusão do processo licitatório. Neste momento, o canteiro de obras está sendo instalado. A previsão é de que a conclusão da obra ocorra entre 12 e 18 meses. O valor investido é de R$ 28,6 milhões.
Além disso, foram investidos cerca de R$ 1 milhão na readequação e reforço de todas as luminárias da PFMOS; na instalação de grades de topo em todos os shafts da unidade, fechando assim o acesso direto ao telhado pela parte interna; na reforma estrutural nas celas de isolamento, triagem, saúde e vivências, eliminando ferros e vergalhões expostos na estrutura.
O MJSP aponta ainda que foram instaladas grades em todos os shafts, fechando o acesso direto ao telhado pela parte interna, com solários de isolamento também fechados.
- Punições
Desde a fuga, servidores do sistema penitenciário federal foram suspensos e parte deles precisou assinar Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), com 17 servidores se comprometendo a adotar uma série de medidas, incluindo a obrigação de não reincidir nas mesmas infrações e a participação em cursos de reciclagem. Foram instaurados três Processos Administrativos Disciplinares (PADs) em desfavor de dez servidores, sendo quatro deles suspensos pelo prazo de 30 dias. Há um terceiro PAD em andamento.
Além dos três PADs, duas Investigações Preliminares Sumárias (IPS) foram instauradas, com uma delas em andamento. Dois dos PADs já foram concluídos. No primeiro, foram aplicados dois TACs. O terceiro PAD ainda está na fase de instrução, e há, ainda, uma IPS em andamento.
“A suspensão decorrente da punição do PAD ainda não foi cumprida, porque está no prazo para recurso. E, como os processos correm em sigilo, não é possível informar os nomes dos investigados”, disse o MJSP à TRIBUNA DO NORTE.
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