Foto: Wilton Junior/Estadão
A três dias da entrada em vigor de tarifas de 50% contra exportações brasileiras, interlocutores do governo Luiz Inácio Lula da Silva afirmam que não há previsão de ocorrer agora um telefonema entre o petista e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Embora a chamada esteja fora do radar no momento, a possibilidade de contato direto à distância existe e vem sendo cogitada por aliados políticos de Lula, membros da diplomacia e conselheiros presidenciais.
A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, disse nesta terça-feira, 29, que uma conversa entre os dois “não é um telemarketing” e precisa de preparação prévia. Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que não pode haver um sentimento de “vira-latismo” no diálogo entre Lula e Trump.
Algumas alas governistas e executivos de empresas mais afetadas pelo tarifaço defendem que o presidente tome a iniciativa de tentar o telefonema, passo que não foi decidido ainda.
O governo brasileiro gostaria de ter a certeza de que Trump não somente atenderia Lula como estaria disposto a centrar a discussão na relação econômico-comercial e negociar as tarifas, para evitar constrangimentos políticos.
Por outro lado, impera no governo Lula a visão de que Trump busca uma concessão de viés político-institucional, para reabilitar eleitoralmente o aliado Jair Bolsonaro. Nas palavras de integrantes do governo, Trump quer o “inegociável”.
Desde a posse do republicano, as interações dele com chefes de Estado e de governo estrangeiro chocaram o Planalto, que considerou ter havido “humilhações” em série a governantes estrangeiros, entre eles os presidentes da África do Sul, Cyril Ramaphosa, e da Ucrânia, Volodmir Zelenski, durante visitas no Salão Oval da Casa Branca.
A repetição de diálogos ríspidos, acusações e hostilidades é algo a ser evitado em possível interação com Lula. Por isso, eventual contato é cercado de cuidados e deve ser preparado pelas burocracias estatais — “sem improviso”, como destaca um embaixador.
Não é a primeira vez que um telefonema entre eles é cogitado, mas não se materializa. Quando Trump foi eleito, em novembro de 2024, o governo brasileiro passou a considerar a possibilidade de uma chamada.
Lula fez uma rápida publicação nas redes sociais reconhecendo a vitória de Trump como sinal de abertura nesse sentido, mas as divergências políticas prevaleceram. Trump e Lula são de campos ideológicos opostos e fizeram campanha para seus principais adversários eleitorais um do outro. Além disso, têm um histórico de provocações e críticas mútuas.
Eles se desencontraram na Cúpula do G-7, no Canadá, em junho, e jamais interagiram.
O contato virtual voltou a ser debatido após o anúncio do tarifaço de Trump contra o Brasil, por meio de uma carta assinada e divulgada por ele nas redes sociais — documento que o Itamarty mandou devolver.
Questionado em entrevistas, Lula chegou a dizer somente telefonaria para Trump quando tivesse o que falar com ele, mas depois mudou o tom e disse que o Brasil estava disposto ao diálogo quando o republicano quisesse conversar.
O americano também já admitiu que pode conversar com Lula, em algum momento, sem nunca marcar nem tomar a iniciativa de reunião. Ao contrário, os sinais recebidos são silêncio e canais bloqueados.
Por isso, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, fez chegar ao governo Trump sua disposição de ir a Washington nesta semana, caso pudesse ser recebido em alto nível para debater a questão tarifária.
O chanceler de Lula participou de reuniões nas Nações Unidas, nesta segunda-feira, 28, e permanece em Nova York, nesta terça-feira, 29, em articulações de bastidor, mas sem ter recebido qualquer sinal verde.
Um contato frutífero de Vieira com representante de Trump seria parte do protocolo prévio para o diálogo direto entre os presidentes.
Deu no Estadão