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O Brasil entra esta semana em um período decisivo, que pode mudar para pior o rumo de sua economia – pelo menos no curto prazo. Está prevista para entrar em vigor na sexta-feira, 1º de agosto, a tarifa de 50% prometida pelo presidente americano, Donald Trump, para todos os produtos brasileiros vendidos para o mercado americano. E, pelo menos até o momento, não há o menor sinal de que esse movimento poderá ser revertido ou adiado.
As tentativas do governo brasileiro de negociar com os EUA, encabeçadas pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, têm se mostrado infrutíferas. Na semana passada, Alckmin disse ter tido no sábado, 19, uma conversa de 50 minutos com o secretário de Comércio americano, Howard Lutnick. “Nós conversamos com o governo norte-americano, tivemos uma conversa com o secretário de Comércio, longa, colocando todos os pontos e destacando o interesse do Brasil na negociação, e destacando que o presidente Lula tem orientado negociação, não ter contaminação política nem ideológica”.
Mas o próprio presidente Lula parece não ter muita esperança de uma reversão da cobrança até o dia 1º. Na sexta-feira, 24, disse que o vice-presidente liga todos os dias para conversar sobre a tarifa, mas que ninguém responde. “Ninguém pode dizer que o Alckmin não quer conversar. Todo dia ele liga para alguém, e ninguém quer conversar com ele”, disse Lula.
Neste domingo, 27, Howard Lutnick afirmou que as tarifas, previstas para começar em 1º de agosto, não serão adiadas. “Sem mais períodos de carência”, afirmou, em entrevista, à Fox News. Mesmo assim, Lutnick afirmou que, quando as taxas começarem, os países ainda poderão falar com o governo americano. “O presidente está definitivamente disposto a negociar e conversar com as grandes economias, com certeza”.
Brasil tem a maior taxa
O prazo de 1º de agosto não é exclusivo para o Brasil. É a data dada por Trump para subir as tarifas para dezenas de países que não conseguirem fechar um acordo a tempo. Mas é no Brasil onde a tarifa será mais alta – nenhum outro país terá a taxa de 50%.
Alguns países já haviam conseguido fechar acordos com Trump, evitando o “mal maior”: Reino Unido, Vietnã, Indonésia, Filipinas e Japão. Neste domingo, 27, foi a vez de União Europeia também finalizar um acerto com o governo americano, com uma tarifa básica de 15% – a ameaça de Trump era elevar a taxa para 30%.
No caso brasileiro, porém, as negociações se tornam um pouco mais complicadas pelo viés político que tomaram. Quando anunciou que taxaria os produtos brasileiros, Trump condicionou a reversão da decisão ao fim do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no STF, que o presidente americano disse ser uma “caça às bruxas”.
“Não estou enxergando um caminho no curto prazo para poder reduzir essas tarifas”, disse o diretor para as Américas da consultoria Eurasia, Christopher Garman. “Nós estamos num embate, e o problema é que o presidente Trump se enxerga no drama do ex-presidente Jair Bolsonaro. Nós precisamos lembrar que o Trump se sentiu vítima de uma caça às bruxas de medidas judiciais. Ele se sentiu censurado. Ele enxerga o movimento progressista Democrata como uma ameaça à democracia. Então, quando ele vê o drama do entorno da família Bolsonaro e as queixas da direita brasileira, o Trump encontra respaldo.”
Para Garman, o melhor cenário para o Brasil, nesse caso, é receber as tarifas e não retaliar. Ao longo do tempo, avalia, pode ser que as empresas e o governo brasileiro consigam algum espaço para aliviar o cenário. “O impacto das tarifas globais tende a chegar ao bolso do consumidor através de mais inflação. Portanto, a Casa Branca pode ficar mais passível de aceitar tarifas menores”, afirma.
O economista André Perfeito, por sua vez, diz que o acordo entre União Europeia e Estados Unidos anunciado neste domingo traz ainda mais pessimismo para a situação do Brasil na busca de uma solução para a questão da tarifa de 50%. “O Brasil está definitivamente isolado e as tarifas ganham ares de sanção que buscam restabelecer a América como quintal dos EUA”, disse.
Para o economista, o acordo aponta para a perspectiva de que os EUA não permitirão que o Brasil se alie de maneira individual a blocos ou projetos que não sejam do interesse de Washington, o que, para Perfeito, “cria uma novidade política que há muito tempo não se via”. Ele considera que a revista The Economist apontou corretamente, em sua edição da semana passada, que o que ocorre com o Brasil só pode ser comparado ao período da Guerra Fria.
Deu no Estadão