Como nasce um garimpo gerenciado pelo crime organizado no meio da selva

 

Há pouco mais de um mês, indígenas da etnia Paiter Surui, que vivem na divisa dos estados de Rondônia e Mato Grosso, começaram a notar que as águas de riachos e afluentes próximos a uma de suas aldeias na Terra Indígena Sete de Setembro tiveram uma ligeira mudança na cor e sabor. Pequenas vias de terra batida também surgiram na mata, assim como rastros da passagem de máquinas pesadas. A ação de garimpeiros na região não era totalmente novidade, mas alguns indígenas que se embrenharam na selva viram algo com o que não estavam acostumados: criminosos armados de fuzis e armas longas.

Ou seja, o novo garimpo de ouro é administrado por uma facção criminosa, segundo o líder indígena do território, cacique Almir Suruí. Habitantes da região suspeitam que os criminosos são ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC). A reportagem vem questionando a Polícia Federal desde o último dia 7 sobre a facção e o garimpo, mas não obteve resposta.

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, esteve na aldeia em junho e foi informada do problema do garimpo. A pasta disse à reportagem que “acompanha o caso de perto”, mas não deu informações sobre medidas concretas.

A partir dos relatos dos indígenas, a Gazeta do Povo encontrou a localização do garimpo e acompanhou sua evolução por meio de imagens de satélites.

A reportagem utilizou imagens de dois sistemas para identificar a atividade ilegal dentro da terra indígena: imagens do sensor Sentinel-2 extraídas do Programa Copernicus, da agência espacial europeia, e imagens do Google Earth, uma ferramenta do Google que agrega imagens de satélites privados e fotografias produzidas por aviões.

Com apoio do perito ambiental Rafael de Souza Tímbola, que é engenheiro ambiental e doutor em Engenharia, foi possível apontar a data estimada de início da atividade na área e o tamanho do garimpo.

Em setembro de 2023, imagens da região mostravam uma área coberta por selva densa. O surgimento e a expansão da área de mineração ocorreu em cerca de 10 meses. O garimpo fica próximo da fronteira entre Rondônia e Mato Grosso. A cidade mais próxima é Cacoal (RO), que fica a 480 quilômetros de Porto Velho (RO).
Nesses dez meses, uma área de 12 hectares (cerca de 120 mil metros quadrados), equivalente a pouco mais de 11 campos de futebol, localizada na parte mais central da terra indígena, foi totalmente modificada. As árvores foram arrancadas e crateras, lagoas e vias improvisadas surgiram no local. Somente em maio de 2024, duas imagens registradas pelo Google Earth com um intervalo de 13 dias apontam que houve um aumento de cerca de 20% da área explorada para mineração.

Diário do Poder

Deixe um comentário